quinta-feira, 7 de junho de 2018

Igreja "com Espírito"


IGREJA EM SAÍDA E NOVO PENTECOSTE

            Mais do que nunca, hoje, nos tempos do Papa Francisco, a Igreja é desafiada a sair de si mesma para cumprir sua missão no mundo. A necessidade de um “Novo Pentecostes” para a Igreja é tema recorrente, desde o Vaticano II, mas agora, com Francisco, a questão toma novo vigor. Ele critica os hierarcas, mas também os fiéis em geral, que não têm coragem de se abrir para o mundo e de ir onde estão as pessoas com suas alegrias e suas dores, seus anseios e suas angústias. A Igreja não deve chamar a atenção sobre si mesma (autorreferencialidade), porém precisa ser presença de Cristo em todas as periferias da sociedade e do mundo. Esta é a ordem que recebeu de Cristo antes de subir ao Pai.

Trabalhar com Espírito
            Francisco fala da evangelização lembrando que os cristãos devem sempre trabalhar “com Espírito”. Esta expressão ensina que não basta ter qualidades ou boa vontade; mas que é preciso estar “possuído” pelo Espírito Santo. Isto é possível para os evangelizadores que “rezam e trabalham”; aqueles que se deixam transformar interiormente. A própria evangelização é a oração, e vice-versa. Sem esta união profunda entre a oração, abertura ao Espírito, e trabalho, dedicação ousada, não existe anúncio eficaz da Boa Nova de Jesus Cristo. O Papa escreve: “Do ponto de vista da evangelização, não servem as propostas místicas desprovidas de um vigoroso compromisso missionário, nem os discursos e ações sociais e pastorais sem uma espiritualidade que transforme o coração” (EG 262).
            Os discípulos, ao receberem o Espírito Santo no Pentecostes, saíram imediatamente para fora. Para fora do lugar onde estavam, mas também para fora de si mesmos. Transformaram-se em anunciadores das maravilhas de Deus com muita ousadia. Igualmente hoje a Igreja necessita de anunciadores ousados que trabalhem com Espírito. Por isso, como dizem os bispos no documento de Aparecida, há necessidade absoluta de um Novo Pentecostes para a Igreja na América Latina e no mundo, para que assim, convertidos “em uma Igreja cheia de ímpeto e audácia evangelizadora, temos que ser de novo evangelizados e fiéis discípulos” (Ap. 549).

“Saída”: Por quem, para onde e por quê?
            A proposta de Francisco merece ser aprofundada para não ficar no abstrato, só na teoria. Perguntamos: Quem precisa sair? Para onde deve sair? E, por que deve sair? À luz destas perguntas pode-se descer para algo bem mais concreto. Veremos:
            Há na Igreja uma tentação que, quando não é combatida, acaba com todo o trabalho pastoral. Trata-se do clericalismo. Ele se verifica no clero, mas também em meio aos leigos. É aquela ideia de que a Igreja é a Igreja dos clérigos, e, daqueles que estão diretamente ligados a eles. Tudo depende deles, uma vez que eles são uma classe especial; pois são mais treinados no saber teológico e na santidade. O clericalismo é uma doença que busca desenfreadamente o poder e a fama. Separa do povo comum. Também leigos pensam e agem “clericalisticamente”; são como “super-leigos” pelo fato de se julgarem iniciados em caminhos clericais.
            A Igreja em saída com Espírito, é a Igreja toda: pastores e leigos. Não temos como separar uns dos outros. Cada um tem sua missão no corpo clerical, mas ninguém tem o direito de se fechar na sacristia. Certamente cabe ao clero ir adiante para os campos do mundo onde acontece a vida; mas lá eles não estão sozinhos, pois é o lugar próprio dos leigos. E, como lembra o Papa Francisco, o pastor sabe ir à frente do rebanho, outras vezes caminha com ele, e ainda, conforme a situação, segue atrás. Então, nada de separação ao perguntar quem deve sair: todos, Igreja Povo de Deus.
Para onde? Para onde houver vida humana. A vida é o dom mais precioso da criação de Deus, e, a Igreja tem a missão de torná-la viável. Jesus diz que veio trazer vida para todos, e a Igreja, como sacramento de Cristo não pode negar sua tarefa de continuar fazendo o que Jesus fez. Lá onde a vida é mais ameaçada a Igreja deve estar mais presente para ser fiel ao seu Mestre.
            Por quê? Consciente do dom gratuito recebido de seu Senhor, a Igreja leva vida a todos sem nada esperar em troca. Nenhum interesse, somente a partir da experiência do encontro com a misericórdia de Deus em Jesus Cristo, o Salvador da humanidade. A alegria de compartilhar a fé, a esperança e o amor.
Concluindo
            Somente uma Igreja “com Espírito” pode trazer um novo Pentecostes para o mundo. A Igreja desejada por Francisco é uma Igreja pobre para os pobres, isto é, uma Igreja livre para ouvir a voz de seu Senhor e dizê-lo a todos. As riquezas amarram e não deixam a vida se desenvolver. Elas têm o seu próprio “espirito”, o espírito do da não-vida para todos.
            Portanto, neste ano do laicato, a grande chamada é para que todos, leigos e ministros ordenados, se conscientizem que é o Espírito que conduz a Igreja, e que ela deve ser dócil aos seus apelos de sair com coragem para as periferias onde a vida é massacrada, esquecida e morta. Todos devem dar gratuitamente do que receberam, pois o Espírito quer renovar a face da terra. Quanto mais a Igreja se envolve na defesa da vida de todos – a começar pelos mais pequeninos -, tanto mais ela cumpre sua missão recebida de Jesus de Nazaré que é levar a Boa Notícia da presença amorosa de Deus entre toda a humanidade. Lá onde está a vida, lá está o Deus de Jesus Cristo.
Pe. Mário Fernando Glaab