sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Vaticano II hoje (6)

PACTO DAS CATACUMBAS (5)
            O quinto item do pacto das catacumbas diz: “Recusamos ser chamados, oralmente ou por escrito, com nomes e títulos que signifiquem a grandeza e o poder (Eminência, Excelência, Monsenhor...). Preferimos ser chamados com o nome evangélico de Padre. Cf. Mt 20,25-28; 23,6-11; Jo 13,12-15.” Os textos bíblicos que os bispos citaram para justificar a sua recusa e preferir o nome de “Padre” são os seguintes: “Jesus, porém, chamou-os e disse: ‘Sabeis que os chefes das nações as dominam e os grandes fazem sentir seu poder. Entre vós não deverá ser assim. Quem quiser ser o maior entre vós seja aquele que vos serve, e quem quiser ser o primeiro entre vós, seja vosso escravo. Pois o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate por muitos’”; “Gostam do lugar de honra nos banquetes e dos primeiros assentos nas sinagogas, de serem chamados de ‘rabi’, pois um só é vosso Mestre e todos vós sois irmãos. Não chameis a ninguém na terra de ‘pai’, pois um só é vosso pai, aquele que está nos céus. Não deixeis que vos chamem de ‘guia’, pois um só é vosso Guia, o Cristo. Pelo contrário, o maior dentre vós deve ser aquele que vos serve.”; “Vós me chamais de Mestre e Senhor; e dizeis bem, porque sou. Se eu, o Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo, para que façais assim como eu fiz para vós”.
            Parece que, entre todos os itens do pacto das catacumbas, esse foi o que menos consequências teve. Praticamente ninguém recusou aos nomes e títulos de honra que por séculos se apoderaram dos discípulos do Senhor que são os pastores do povo, mesmo que estão entre irmãos.
Recusamos
            Recusamos é expressão forte. Diz bem mais que renunciar. Fala de uma ação determinada e ativa: não aceitamos! Talvez por ser tão clara e direta, foi a proposta que mais dificuldades encontrou para se colocar em prática. Renunciar a bens, a aparências luxuosas exige bastante coragem, também para não se deixar levar pelo carinho que os fieis demonstram a seus bispos, padres e líderes religiosos. Dizia alguém com grande sinceridade: “é tão agradável ser bajulado pelo povo!” Os nomes e os títulos vêm como porta de entrada, em seguida vêm as palmas, os louvores e os presentes; e mais outro exclama: “e o vigário gosta!” Não há dúvida que o povo se aproveita desta tática, pois é bem mais fácil “domesticar” o pastor com agrados que com exigências comprometedoras. Também os líderes do povo que pensam em tirar alguma vantagem individual não se cansam de fazer discursos eloquentes ressaltando qualidades dos religiosos, não economizam elogios com os mais insignes títulos. Isto faz dos representantes do povo pessoas inteligentes e bondosas.
            Pelas palavras de Jesus, citadas pelos bispos, pode se ver bem que estas atitudes são próprias dos que dominam sobre os outros, dos que têm intenções obscuras e interesseiras. Nunca deveriam ser as de um bispo, padre ou líder religioso – do seguidor do Mestre que veio para servir, para lavar os pés de seus discípulos. Porém, não dá para esconder como infelizmente esses títulos são procurados pelas autoridades religiosas e usados por eles mesmos em seu favor. Basta ver os discursos pronunciados por eles e entre eles. Os documentos emanados das cúrias ou das secretarias são verdadeiros autoelogios. É bastante hilariante a história do “excelentíssimo e reverendíssimo senhor bispo” que sempre rezava durante a missa por “este indigno servo”, mas quando ficou sabendo que um de seus padres também usava a mesma expressão o proibiu severamente de fazê-lo outras vezes. Por que será?
Nomes e títulos
            O nome identifica a pessoa. É tão bom ser chamado pelo nome! Manter limpo o nome é a maior honra para o seu portador e para a sua família. Título, no entanto, é um acréscimo ao nome. Ele pode ter sido conquistado com esforço e dedicação, mas igualmente pode ter sido adquirido por outros meios, às vezes, espúrios. Nomes e títulos que signifiquem grandeza e poder não combinam com os seguidores do Mestre que lavou os pés de seus amigos. Quem é grande entre os discípulos de Jesus de Nazaré? Tudo tem sua lógica a partir da missão própria da Igreja. Ela, como Cristo, está aí para que todos tenham vida, e vida em abundância. Mas quem busca títulos de honra para si dentro da Igreja inverte as coisas. Busca vida para si; os outros são esquecidos. Bento XVI insistia para que a Igreja entendesse o sentido de sua existência, e dizia: “A igreja não está ali para ela mesma, mas para a humanidade”. Podemos auferir que se ela está para a humanidade, sempre precisa sair de si mesma, pensar nos outros, servir ao mundo a Boa Nova de Deus. Os pastores da Igreja necessitam serem fortes para vencer o perigo da tentação de se dobrar sobre seus próprios interesses, seu passado de glórias, seus títulos acadêmicos, sobre suas posições hierárquicas. Os títulos de grandeza não atingem o coração do homem e da mulher de hoje. Não basta pregar com toda pompa sermões do altar. Os pastores precisam aprender a escutar, acolher, curar as feridas dos que sofrem. Somente assim a Igreja vai ter uma mensagem para o mundo e para toda a humanidade. Os títulos dizem absolutamente nada para quem se sente privado de tudo, principalmente do acesso ao que é mais importante, à vida.
Luz na escuridão
            Um teólogo espanhol (Xabier Pikaza) conta que ficou impressionado quando esteve em São Paulo a conversar com um clérigo sábio e de grande experiência sobre as questões da Igreja hoje, e este clérigo, que ele não prefere nomear, lhe afirmou seriamente: “Não contamos (no Brasil) com bispos que saibam levantar o Evangelho diante de políticos e donos da vida e a sorte dos pobres; faltam-nos bispos que possam ou queiram expor com sua vida a mensagem de Jesus e abrir caminhos para a Igreja... Contamos apenas com funcionários submissos a um sistema de poder sagrado”. Até onde essa constatação é verdadeira, não se sabe; mas que é, no mínimo, preocupante, isso não se pode negar. Porém, quando o teólogo continuou e quis saber como então os bispos deveriam ser, ouviu a resposta: “Como aqueles que vieram imediatamente depois do Concílio Vaticano II! Homens como Paulo E. Arns e tantos outros, ministros da Palavra, criadores de comunidade, encarnados no povo...”. Como aqueles que levaram a sério o pacto das catacumbas.
            O teólogo espanhol desenvolve sua reflexão sobre a necessidade que a Igreja tem de possuir bispos de verdade que vão à frente do rebanho, promovendo a igualdade cristã, a fraternidade, abertos a todos, curando e libertando; tendo como pano de fundo a figura de Dom Paulo Arns. Vê, no entanto, com olhos e coração esperançosos, uma luz em meio à escuridão: o Papa Francisco. Escreve: “talvez Jorge Mário Bergoglio possa ser o novo Arns”. (Artigo publicado pela Newsletter do Instituto Humanitas Unisinos – 13/08/13).
            Não resta dúvida que o Papa Francisco está dando a mensagem evangélica a quem tem olhos para ver e coração para perceber. Somente o Papa para chamar a atenção dos bispos quanto à ambição. Segundo Francisco, os bispos devem ser pastores próximos das pessoas, pais e irmãos, que sejam mansos, pacientes e misericordiosos. Devem amar a pobreza interior como liberdade no Senhor e também a pobreza exterior como simplicidade e austeridade de vida e não devem ter “uma psicologia de ‘Príncipes’” – que não sejam ambiciosos!
            O exemplo de Francisco é impressionante. Ser for acolhido por um bom número de bispos, padres, líderes e povo em geral, poderá provocar uma primavera para toda a Igreja. E, quem sabe, o Evangelho poderá produzir muitos frutos de justiça, de vida e de fraternidade em e com toda a humanidade. Que os bispos, monsenhores, padres e líderes religiosos deixem seus títulos de lado e sejam todos irmãos, mesmo que uns, dentro da família cristã, têm a missão do pastoreio ou da paternidade espiritual. Que haja respeito, mas igualmente dignidade e humildade entre todos.
Pe. Mário Fernando Glaab

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segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Hunsrik

Trostwetta

No’n Traung is de junge Brautigam zum Priester kum um saat mit sorgische Blick: “Liewe Podda, eich danke herzlich fa die scheene Trostwetta wo dea uns vorgesaad hot”. En irrtum kan hal Jede mo praktiziere!

Glaabsmário

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Vaticano II hoje (5)

PACTO DAS CATACUMBAS (PONTO 4)

            No quarto item do pacto das catacumbas os bispos assim se expressam: “Cada vez que for possível, confiaremos a gestão financeira e material em nossa diocese a uma comissão de leigos competentes e cônscios do seu papel apostólico, em mira a sermos menos administradores do que pastores e apóstolos. Cf. Mt 10,8; At 6,1-7”. Os textos bíblicos citados dizem o seguinte: “Curai doentes, ressuscitai mortos, purificai leprosos, expulsai demônios. De graça recebestes, de graça deveis dar!” e, “Naqueles dias, o número dos discípulos tinha aumentado, e os fiéis de língua grega começaram a queixar-se dos fiéis de língua hebraica. Os de língua grega diziam que suas viúvas eram deixadas de lado no atendimento diário. Então os Doze apóstolos reuniram a multidão dos discípulos e disseram: ‘Não está certo que nós abandonemos a pregação da palavra de Deus para servirmos às mesas. Portanto, irmãos, escolhei entre vós sete homens de boa reputação, cheios do Espírito e de sabedoria, para que lhes confiemos essa tarefa. Deste modo, nós poderemos dedicar-nos inteiramente à oração e ao serviço da Palavra’. A proposta agradou a toda a multidão. Escolheram então Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo; e também Filipe, Prócoro, Nicanor, Tímon, Pármenas e Nicolau de Antioquia, um prosélito. Eles foram apresentados aos apóstolos, que oraram e impuseram as mãos sobre eles. Entretanto, a palavra de Deus crescia, e o número dos discípulos se multiplicava consideravelmente em Jerusalém. Também um grande grupo de sacerdotes judeus aderiu à fé”.

Cada vez que for possível
            “Cada vez que for possível...” é uma proposta humilde. Tem consciência de que a administração das dioceses é muito complexa. Para transparência e funcionalidade, não poucas vezes, é necessário acompanhamento direto do bispo, como último responsável. Mas confiar a gestão financeira e material a leigos preparados para a tarefa pode ser um grande salto na busca da vivência mais comprometedora do pastoreio, próprio do bispo. A gestão financeira, quer queira, quer não, envolve demais o pregador da Palavra em negócios; e os negócios sempre têm sua característica própria, o “tirar vantagem”: é a circulação do dinheiro que exige habilidade para a perspicácia lucrativa. O “deveis dar de graça” não se encaixa nos negócios. Os negócios não são da linguagem gratuita, pois eles sempre visam vantagens. “Fazer um bom negócio” significa levar boa vantagem. Mas os bispos, quanto mais se conformarem com o Divino Mestre, não podem visar esses “bons negócios”. Não há dúvida de que ao confiar a gestão financeira e material a leigos preparados, os bispos estão cada vez mais cônscios de que eles, como “outros Cristos” devem estar em primeiro lugar onde estão os pobres, uma vez que se pode afirmar, baseado no Evangelho, de que onde estão os pobres aí está Cristo. A segunda parte, que é tarefa primeira dos bispos, a de levar a Igreja onde está Cristo, depende da liberdade que cada um tem com relação aos bens. O desapego facilita o aproximar de Cristo entre os pobres, mas as preocupações com a gestão financeira obstacula, e grandemente, estar com Cristo e com os pobres. Infelizmente, a Igreja – na pessoa de seus bispos -, estava e está frequentemente mais perto do palácio de Herodes do que da gruta de Belém. A Igreja precisa redescobrir constantemente onde está o seu lugar na sociedade. A proposta é muito boa.

Confiar a leigos
            Aí podemos aludir à outra questão: qual a importância dos leigos nas dioceses, nas paróquias e nas comunidades em geral? Confiar a leigos competentes e cônscios do seu papel apostólico a gestão financeira de uma diocese ou comunidade exige, antes de tudo, desprendimento. Elogiar os leigos quando são generosos é fácil, e pode ser uma boa tática para conservá-los sempre assim; mas confiar a administração a eles, isso já é outra coisa. Além do desprendimento, isso exige confiança e humildade. Alguns insistem em afirmar que são poucos os leigos competentes e, que por isso, é melhor que as coisas fiquem como estão; não convém correr o risco. Mas, entre os clérigos todos são competentes e confiáveis?! Entre os próprios apóstolos estava um que roubava da bolsa comum! Todavia, mesmo assim Jesus não lhe tirou a bolsa. Os leigos não são súditos ou meros servidores dos pastores, mas seus irmãos.

Ser menos administradores
            “Ser menos administradores do que pastores e apóstolos”. Esta é a questão. Os bispos que assinaram o pacto não tinham ilusões. Sabiam muito bem que a sua função de líderes religiosos os envolvia também no administrar bens da Igreja, e até bens pessoais. Contudo, queriam se dispor a ser, como o Divino Mestre, antes de tudo, pastores e apóstolos. Como pastores, ir ao encontro de povo para cuidar dele; e como apóstolos, dar ao povo o testemunho de que Deus está entre nós. Nessa tarefa queriam estar livres das amarras dos bens materiais. Jesus chama insensato quem confia nos bens (cf. Lc 12,20) e se esquece de que são para todos. Para ser mais pastor e apóstolo do que administrador, o discípulo de Cristo deve descobrir sempre mais que é na partilha e na confiança fraterna que as coisas funcionam, e que do contrário, o mundo fica sempre na mentalidade do tirar proveito. Os ricos vão açambarcando cada vez mais bens e os pobres vão afundando cada vez mais na miséria. Não existe outra saída, pois o administrador é, antes de tudo, aquele que se preocupa com os bens; os pobres, para o administrador, quando não incomodam, são deixados para mais tarde, porém quando incomodam, aí necessitam de controle e de “um jeitinho”, que não passa de manipulação.

A proposta hoje
            Olhando para os 50 anos que sucederam ao pacto das catacumbas podemos ver que muitos bispos, padres e líderes religiosos optaram por Cristo pobre e se desvencilharam de amarras administrativas. Não é possível, no entanto, esconder o outro lado da moeda: mormente nos últimos anos, cresce assustadoramente a busca de bens e de status entre os pastores. Para vergonha geral, quando alguém dá informações sobre determinada diocese ou paróquia, uma das primeiras considerações que faz, trata de sua situação financeira, diz-se, por exemplo, “é boa, pois tem estabilidade financeira”, ou, “é complicada, pois é pobre”. Podiam-se elencar inúmeros casos de dissabores causados por preocupações exageradas de líderes religiosos por serem “bons administradores” primeiramente, e, depois, quando sobra tempo, um pouco pastores. Pastores, para exigir a observância das leis canônicas áridas e impessoais.
            Provavelmente o sinal mais eloquente da necessidade de renovar a proposta do item 4 do pacto é a insistência do Papa Francisco para que os bispos sejam amantes tanto da pobreza interior como da pobreza exterior, sejam amantes da simplicidade e da austeridade de vida, que não tenham “psicologia de príncipes”, mas liberdade no Senhor. As palavras e os gestos de Francisco são um verdadeiro sopro do Espírito para os nossos dias, e não poucos bispos, padres e líderes estão incomodados. Mas, quem sabe, terão a coragem de acolher em tudo isso, a mensagem atual da Boa Notícia de Jesus de Nazaré que continua a clamar: “grande será a vossa recompensa no céu” (Lc 6, 23). Mesmo sabendo que na mentalidade do mundo quem não é bom administrador não conta, Jesus de Nazaré deixa claro que esse mundo é injusto; e que, os que não interessam a ninguém são os que mais interessam a Deus. Os que são marginalizados ou excluídos são os que ocupam um lugar privilegiado no coração de Deus; os que não têm quem os defenda têm a Deus como Pai. Os pastores devem estar onde estão as ovelhas.
Pe. Mário Fernando Glaab

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