NOVOS
DESAFIOS PARA A TEOLOGIA E PARA A PASTORAL
Não adianta esconder o sol com a peneira, pois os raios dele
passam pelos seus furos e atingem áreas desprotegidas, tanto de nosso corpo
quanto de nossos ambientes fora ou dentro de casa. Ainda mais quando se reside
em regiões bastante ensolaradas, como é a nossa.
Mas não é sobre os raios solares que pretendo discorrer;
quero na verdade chamar a atenção para alguns desafios da teologia e da
pastoral de nossa Igreja. Até alguns anos passados, tudo parecia tranquilo. A
teologia tinha suas verdades que pareciam perenes e a pastoral não fazia muito
mais do que aplicar essas verdades para os fiéis. Os fiéis recebiam essas
verdades de seus pastores, orientavam-se por elas e se sentiam seguros. Hoje,
no entanto, as coisas mudaram, e não pouco. Parece que os desafios e as
perguntas que vêm do mundo atual já não se deixam mais conter por tais certezas
que eram tão resistentes. As questões penetram por todas as frestas e começam a
queimar as peles. Quanto mais sensíveis forem as peles, tanto mais sofrerão as
queimaduras.
Igreja:
sinal universal de salvação
Para evitar que as questões provoquem maiores
consequências, podendo levar a tumores insanáveis, quero considerar como
desafio pregações e fundamentações latentes, que quase sempre, norteiam as
mensagens em nossas igrejas. Partindo da necessidade de se ter uma igreja na
qual se vive e à qual se pertence, apresenta-se a verdade da Igreja: ela é o
sinal universal de salvação para o mundo. Tudo certo. Todavia, a teologia tem
como tarefa deixar claro que sinal é sempre sinal para alguém. Ou melhor, deve
orientar as pessoas que querem avançar. Quando o sinal ocupa o lugar daquilo
que sinaliza, perde seu sentido. Quantas vezes as pregações voltam-se para a
Igreja, apresentam-na em sua pureza ideal. Não vão muito além. Não respondem às
reais perguntas do homem de hoje. Assim, na prática, a intenção tem como meta
“encher” as igrejas de fiéis que formam um grupo seleto e protegido. Estas
pessoas que participam das celebrações ordinárias das paróquias estão “salvas”.
Fecha-se a Igreja diante do mundo, tanto teológica como pastoralmente. Quem
está no mundo, se quiser ter contato com a Igreja, necessariamente vai ter que
entrar pela porta da sacristia. Essa porta para ser aberta, geralmente exige
cursos, encontros, preparações de todo tipo; pior ainda, certificados de cursos!
O pregador que mais consegue chamar a atenção sobre a beleza de sua igreja, que
mais atrai, leva vantagem com relação ao que não tem esses dotes. A
concorrência torna-se o motor que move todo trabalho pastoral, escondendo uma
teologia subjacente que se baseia em princípios certos, mas mal atualizados.
A
verdade que protege e faz crescer
O Papa Francisco e muitos teólogos e pastores sérios
ensinam que a Igreja não pode chamar a atenção sobre si, mas deve, cada vez
mais, ser uma Igreja “em saída”. Ela precisa ir às periferias da sociedade onde
estão os desafios das multidões. A verdade da Igreja se atualiza lá, onde as
pessoas são mais carentes dos sinais de salvação, que lhe são próprios. A
Igreja é verdadeiramente sinal de salvação quando leva Jesus Cristo, o Salvador
da humanidade, aos ambientes que mais carecem dele. Ela, portanto, antes de se
preocupar consigo mesma, consciente de Jesus que veio para dar vida abundante,
se coloca sempre em defesa da vida de todos e, em todas as situações. Jesus de
Nazaré não veio ensinar uma religião, mas ao constituir a sua Igreja deu-lhe a
tarefa de fazer de todos os povos discípulos seus, isto é, convocá-los a
defender a vida e a dignidade de todo ser humano diante das forças
destruidoras. A Igreja e qualquer religião são verdadeiras quando saem de si e
vão para o mundo com a missão de servir à vida. A vida, conforme o Criador a
dispôs, que, sem dúvida, leva à realização plena; não só nesta terra, mas
também na vida futura. É a verdade que protege e faz crescer.
Nas periferias da sociedade estão os pobres: os pobres de
bens necessários para viver com dignidade, os explorados, os excluídos, os
perdidos nos vícios, os grupos minoritários etc.
Se a teologia e a pastoral da Igreja quiserem proteger a
“pele” da sociedade de hoje, não podem se furtar da tarefa de ir aos desvalidos.
Desmascarar qualquer pregação que visa somente o sucesso e a aparência da
comunidade fechada; mostrar o caminho para que, saindo de seu comodismo, vá
para onde a vida é mais ameaçada. Lá, envolvendo-se com a “escória” da
humanidade, mesmo que se suje com sangue contaminado, transfundir com sangue
novo os corpos dilacerados e malcheirosos. Apontar para Cristo que morreu entre
malfeitores, porém, mesmo assim, teve a ousadia de gritar: “Pai, em tuas mãos
entrego o meu espírito”. Teologia e pastoral que não favorecem uma Igreja “em saída”
e envolvida nas dores do mundo estão tentando esconder o que é próprio da
Igreja: levar luz para quem está na escuridão. Se isso não acontecer pelos
caminhos ordinários, por outros caminhos os raios de luz irão penetrar, mas
podem causar graves queimaduras.
Pe. Mário Fernando Glaab
WWW.marioglaab.blogspot.com