sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Importância da formação teológica nas paróquias.

FORMAÇÃO TEOLÓGICO-PASTORAL PARA GESTORES PAROQUIAIS

            Os gestores paroquiais sabem muito bem que na sociedade onde pululam ofertas religiosas por toda parte, num ambiente plural como o nosso, a visibilidade e beleza das igrejas, seus cultos e atendimentos paroquiais simpáticos não podem faltar, pois para competir com tudo isso, eles são essenciais. Isso está claro. Templos, celebrações, equipes litúrgicas, padres e funcionários paroquiais que não atraem pela beleza, pela simpatia pela leveza, não conseguem seu lugar em meio à esfomeada concorrência da oferta do mercado religioso no mundo plural em que vivemos.

Pastoral de conversão
            Porém, só isso é pouco. A preocupação do gestor não pode ficar somente neste aspecto. Ela necessita estar atenta, pois o gestor deve estar em comunhão com todo o andamento pastoral e teológico da Igreja, no mundo, e, principalmente no Brasil. Assim, sua ação estará carregada de conteúdo sólido e, de fato, poderá responder às questões das pessoas de hoje, em seus anseios e incertezas, próprias da turbulência que agita a sociedade hodierna, e também à Igreja nas suas mais diferentes comunidades.
            Para tal, o gestor precisa conhecer os modelos teológico-pastorais que norteiam a ação evangelizadora da Igreja. É de extrema importância, a partir do Documento de Aparecida e, ultimamente, da Encíclica Evangelii Gaudium, para citar apenas dois, que se conceba a Igreja como “Igreja de Igrejas”, ou ainda, a paróquia como “comunidade de comunidades”; pois, o Papa Francisco não se cansa de convocar todos para uma “pastoral de conversão missionária”. Francisco desafia a Igreja, no nosso caso as paróquias com seus primeiros responsáveis, para sair da sacristia e ir para as periferias onde estão as pessoas.
            A pastoral de conversão missionária é um processo – não está terminado. O gestor precisa saber que não possui um “pacote” de verdades a oferecer a quem o procurar. Ele, necessariamente, deve entrar na dinâmica do encontro direto, tanto com Jesus Cristo quanto com o povo, também com aquele que não vem à sacristia ou à missa dominical. Nesse duplo encontro é que se efetua a conversão do agente, e consequentemente, das pessoas que são tocadas “corpo a corpo”, não como massa. Para isso, no entanto, o gestor, além de se utilizar dos meios modernos de comunicação, e além de conhecer suas técnicas; não pode deixar de se aprofundar nos conhecimentos teológicos; assim ter mais teologia que doutrina, mais princípios que dogmas, e ser mais pastor que administrador ou organizador.

Paróquia missionária
            A metodologia que orienta a conversão missionária é a de Jesus e das comunidades cristãs primitivas. Convidam-se as pessoas concretas – os indivíduos – para o discipulado. À medida que o processo mestre-discípulo se concretiza, acontece a organização, a estruturação e a instituição da entidade. Contudo, também o mestre aprende com os discípulos. Conforme as necessidades e questionamentos deles, ele se adapta e se forma. Nas igrejas embrionárias foi assim, e, pelos séculos afora não foi diferente. O perigo está em se fechar no passado, pensando que já se sabe tudo e, que não é preciso crescer e se renovar continuamente.
            Para não se deixar levar pela onda do momento, é igualmente importante salientar que conhecimentos teológicos básicos, fundamentados nos modelos eclesiológicos e pastorais elaborados por mestres experimentados, protegem os valores evangélicos de interpretações ou de doutrinas falsas. O gestor é antes de tudo profeta. Isso por ter formação teológico-pastoral sólida; e por estar inserido na vida, na atividade e na dinâmica transformadora dos paroquianos.
            Administrar com competência uma paróquia e torná-la visível e bela é, sem dúvida, necessário; contudo, colocá-la ao dispor das pessoas para ser instrumento de salvação, de libertação, de misericórdia, de vida plena é mais necessário ainda. Qualquer que seja o gestor paroquial, não deve nunca se furtar de aprofundamentos teológico-pastorais. Além de participar dos encontros de formação em sua comunidade, deve estudar e refletir por conta própria, e fazer a experiência com o povo com o qual convive.

Sugestões:
1-      Deve-se investir para que o conjunto que forma uma paróquia - templo, liturgia, equipes de celebração, cantos, desenvolvimento dos ritos, funcionários, secretários... – seja belo e visível para que os fiéis possam ver e se sintam bem;

2-      Deve-se, no entanto, não ficar somente nesse primeiro aspecto. Os gestores precisam conhecer os fundamentos teológicos e eclesiológicos da Igreja, especialmente da Igreja no Brasil nos tempos atuais;


3-      Os últimos documentos da Igreja convidam à “pastoral de conversão missionária”, isto é, desafiam a todos, mas diretamente os gestores, a fazer a experiência do encontro pessoal com Jesus Cristo e com as pessoas concretas. A partir de Jesus colocar-se no caminho do discipulado com os irmãos, e com eles procurar na Igreja respostas para as perguntas e saída para as angústias que os atormentam;

4-      Os gestores devem ter mais teologia que doutrinas; mais espírito de pastoreio que de administração;


5-      Os gestores, baseados em fundamentos sólidos, nunca “negociam” os valores evangélicos, mas como profetas os apresentam, com novas roupagens ou novas interpretações para a defesa do homem todo e de todos os homens. Esta é a presença da Igreja – da paróquia – no mundo, junto às pessoas – também nas periferias da humanidade.

Pe. Mário Fernando Glaab

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Viver na história, não da história

CABEÇA ERGUIDA, PÉS NO CHÃO

            Ouve-se frequentemente esta recomendação: cabeça erguida, pés no chão. É para lembrar que, na realidade humana, as duas dimensões não podem faltar e nem ser substituídas, nem uma privilegiada em detrimento da outra. O ser humano é animal racional, não somente animal, não somente racional, é corpo e alma, matéria e espírito. Igualmente se pode afirmar que o ser humano vive da história, mas não pode deixar de fazer história.

E Deus viu que era bom!
            O primeiro livro da Bíblia nos diz que Deus contemplou a criação, obra de sua Palavra poderosa, e viu que era tudo muito bom! (cf. Gn 1). O Papa Francisco, em sua Encíclica Laudato Si, lembra algo muito interessante dos ensinamentos de São Francisco de Assis, ao citar que o Santo pedia aos seus seguidores, “que no convento, se deixasse sempre uma parte do horto por cultivar, para aí crescerem as ervas silvestres, a fim de que, quem as admirasse, pudesse elevar o seu pensamento a Deus, autor de tanta beleza” (LS 12). E o papa explica o ensinamento do grande Contemplador das Maravilhas de Deus na Natureza, lembrando que Deus se revela pela natureza, além do livro da bíblia, como em um outro livro muito maravilhoso, dando a conhecer Sua beleza e bondade. O mundo com tudo o que contém é um mistério que convida à contemplação gozosa; faz experimentar alegria e leva ao louvor. Mesmo que no mundo se encontram espinhos, ele é bem mais do que uma problema a resolver, pois nele o Deus invisível ser faz visível para quem o respeita e tem fé.
            Quando eu ainda era uma criança, lembro que conheci uma mulher, uma senhora do povo pobre, muito humilde e analfabeta, mãe de muitos filhos; sua fé era visível nos afazeres do dia-a-dia. Além de cuidar da família, enfrentando momentos dificílimos quando faltava tudo, até mesmo o alimento, a saúde, o trabalho; ela ainda arrumava tempo para ajudar aos outros. Ela era parteira; daquelas que nunca fizeram curso algum, mas que pela prática nas maiores necessidades dos pobres de Javé, aprendera a ajudar a dar à luz. Apoiar aquelas que colaboravam com o Deus da Vida era para ela sagrado! Andava por toda a região ajudando, rezando, incentivando e sofrendo junto – uma santa! -, não como a “sociedade civilizada” concebe os santos, mas conforme o Deus de Jesus de Nazaré declara seus santos, os bem-aventurados.
            Esta mulher, sem saber ler, sem saber de nada das preocupações sobre o meio-ambiente, quando fazia suas rocinhas onde cultivava o sagrado alimento para a família, tinha uma intuição divina que a levava a deixar um cantinho sem colher, para que os passarinhos também tivessem alimento. É possível acreditar?! Sim; é pura verdade!
            Ao compartilhar a sua preocupação com a natureza foi considerada, pelas demais senhoras, de ignorante, e até fizeram dela motivo de chacota. Ela, no entanto, não ligava. Não era a sua pessoa que importava, mas cuidar da família, dos necessitados e da criação de Deus. Por ela, também hoje, Deus via que tudo era muito bom.
Viver na história, não da história

            Facilmente nos apegamos às conquistas que durante a história a humanidade adquiriu. Gostamos de viver no passado. Somos conservadores doentios. Sonhamos em acumular para poder usufruir sempre mais. Queremos ter muitas posses, garantias onde nos podemos colocar nossa confiança. Na verdade, não deveria ser assim: Deus em seus dois livros: na bíblia e a natureza, nos ensina outra maneira para viver. São tantos os homens de fé, de esperança e, especialmente de caridade que testemunham este outro jeito de viver. São Francisco, o Papa Francisco, e de modo todo particular, esta mulher, típica do povo simples, pobre e lutador, convocam-nos a ter os pés no chão, viver da história, mas muito mais, na história.
            O Espírito de Deus, que pairava sobre as águas quando a terra ainda estava deserta e vazia (cf. Gn 1), continua a soprar em todos os cantos de nosso imenso planeta, principalmente onde encontra homens e mulheres que o sabem acolher, sabem intuir seu sopro de amor, de respeito e de proteção. A nossa cabeça deve estar erguida para que possamos ver, ouvir e sentir para onde o vento sopra, mas os pés devem estar bem fixos no chão da existência concreta. Toda a criação está repleta do Espírito de Deus.

Pe. Mário Fernando Glaab