PASTORES
CONVERTIDOS – PASTORAIS CONVERTIDAS
Nos últimos anos, principalmente a partir da V
Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe em Aparecida,
falou-se muito sobre a conversão pastoral, tão necessária para a Igreja, para
os pastores e para cada cristão que pretende levar a sério o Evangelho no
contexto em que vive, concretamente, na comunidade onde se encontra. Comunidade
esta que é sempre perpassada por sociedade extremamente plural, com situações
muito diversas: gente boa, menos boa e má; gente que vive na prosperidade,
gente que possui o necessário para bem viver e, muita gente que vive na
carência do que é preciso para uma vida digna, que pode ser resumida nos termos
técnicos: teto, trabalho e terra.
Pastor
e pastoral
Não há muito que discutir, para o cristão, ser pastor é
ser parecido com Jesus de Nazaré, que desde o início da missão até o fim,
sempre se apresentou e agiu como o Pastor por excelência. Ele é, e sempre
haverá de ser, o modelo para quem pretende colaborar com a Igreja no pastoreio
das milhares de ovelhas que andam pelos prados deste imenso continente
latino-americano, tantas vezes machucadas, perdidas e famintas. O pastor, a
exemplo do Mestre de Nazaré, necessita ir ao encalço das que estão extraviadas
e excluídas pela sociedade que, como o lobo feroz, devora e destrói
violentamente. Sem dúvida, para continuar a missão de Jesus no hoje da história
e no aqui da realidade, o Evangelho necessita de atualização. Precisa ser
reinterpretado a partir de onde cada pastor está – junto das ovelhas. Não dá
para esquecer que o Espírito Santo que impulsionou Jesus a ir ao encontro da
ovelha perdida, já vai na frente de qualquer empreendimento pastoral. Ele está
lá, esperando que o pastor o descubra e o deixe agir. Ele, o Espírito, não
fala; mas quer iluminar o pastor para que proclame aí a Palavra, que é o
Cristo. O pastor, então, longe de se apresentar com palavras prontas, vai para
junto das vítimas de todas as espécies - em uma palavra -, junto aos pobres. Lá
irá reinterpretar a Boa Notícia que Jesus de Nazaré não cansa de anunciar: “O
Espírito do Senhor está sobre mim, pois ele me consagrou com a unção, para
anunciar a Boa-Nova aos pobres” (Lc 4,18).
A pastoral, longe de ser um “empacotado” que vem de cima,
pré-concebido nas secretarias paroquiais ou diocesanas, será experiência
concreta da vida querida, amada e protegida nas mais diversas situações e
desafios que o nosso mundo apresenta. Planejamento não será dispensado, mas a
metodologia usada em uma pastoral convertida há de ser a que o Espírito indicar
em cada caso. Conforme as pessoas, sua cultura, suas tradições, seus costumes,
porém especialmente, diante dos desafios mais prementes da comunidade, à luz da
Palavra de Deus, da experiência do amor vivido por séculos na Igreja,
escolher-se-á o melhor método de evangelizar. Esta será a pastoral convertida.
Novos
conceitos e novas posturas
O Papa Francisco nos lembra com propriedade que a Igreja
deve ser “Igreja em Saída”. Mesmo que oficialmente a Igreja deixou de lado a
preocupação do proselitismo, ainda existem fortes resquícios desta prática em
numerosos cristãos de hoje. Isto se verifica quando nos planejamentos pastorais
se olha em primeiro lugar para aqueles que normalmente participam das
celebrações litúrgicas nas igrejas, contribuem com seu dizimo, têm seu filhos
na catequese, fazem encontros de formação etc., e se constata, com tristeza,
que são poucos. A partir desta constatação, para aumentar o número dos
“arrebanhados”, procura-se encontrar o método mais conveniente para convencer o
maior número possível. É o caso do pastor que diz consigo mesmo: “graças a
Deus, eu tenho a igreja sempre cheia!”, e às vezes faz comparações com as
paróquias dos colegas que não têm tanta sorte assim.
Nossos tempos exigem novos conceitos e novas posturas
para o trabalho evangelizador, deixando de lado a preocupação com o
proselitismo, e mais ainda a competição com outras igrejas. “A Igreja não faz
proselitismo. Ela cresce muito mais por ‘atração’: como Cristo ‘atrai todos a
si’ com a força do seu amor, que culminou no sacrifício da cruz, assim a Igreja
cumpre a sua missão na medida em que, associada a Cristo, cumpre a sua obra conformando-se
em espírito e concretamente com a caridade do seu Senhor” (Bento XVI na Missa
de Inauguração da Conferência de Aparecida).
Se amor de Cristo o levou a estar junto das vítimas de
todos os tempos, e assim, com eles ir à cruz, um conceito de pastoral
verdadeiramente novo que gera nova postura não pode ser outro, a não ser o de estar
do lado das vítimas e dos pobres em geral, mesmo que isso leve também à cruz.
Esse novo conceito e essa nova postura desafiam a todos nós, mas quem não
estiver disposto a tomar sobre si a sua cruz, também não é digno do verdadeiro
Pastor Jesus.
Na história do cristianismo já surgiram inúmeras
preocupações para manter a Igreja bem protegida de ataques externos. No
entanto, a história também ensina que muitas vezes essas preocupações, quando
não bem fundadas no Bom Pastor, fizeram grande mal. Quem, no afã de ser
ortodoxo, divide, separa, exclui, marginaliza ou condena, é um dos piores inimigos
da Igreja e do Evangelho. Às vezes, esse inimigos são os que parecem “piedosos”
e, com frequência estão entre os que têm cargos de autoridade e poder na
Igreja. Cuidemos para ter ideias e conceitos claros para nãos nos tornarmos
inimigos da Igreja ou sermos cúmplices dos inimigos.
Portanto, tanto a Igreja quanto os pastores da Igreja
necessitam de conversão. E sempre de novo. O Bom Pastor é o grande ideal. No
entanto, as tentações de se fazer pastor e pastorear em seu próprio benefício
estão sempre presentes. A conversão é um processo contínuo de purificação e de
atenção, pois o Espírito clama, não por Si (não tem voz), mas o faz pela voz
das vítimas de nossas sociedades injustas e excludentes. Se Jesus aceitou a
função mais baixa a que uma sociedade pode submeter alguém: a de delinquente
executado por blasfêmia e subversão, também os que lhe querem servir não podem
temer esta mesma sociedade e o ela lhes tem a oferecer.
Pe. Mário Fernando Glaab
www.marioglaab.blogspot.com