quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Pastoral hoje.

PASTORES CONVERTIDOS – PASTORAIS CONVERTIDAS

            Nos últimos anos, principalmente a partir da V Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe em Aparecida, falou-se muito sobre a conversão pastoral, tão necessária para a Igreja, para os pastores e para cada cristão que pretende levar a sério o Evangelho no contexto em que vive, concretamente, na comunidade onde se encontra. Comunidade esta que é sempre perpassada por sociedade extremamente plural, com situações muito diversas: gente boa, menos boa e má; gente que vive na prosperidade, gente que possui o necessário para bem viver e, muita gente que vive na carência do que é preciso para uma vida digna, que pode ser resumida nos termos técnicos: teto, trabalho e terra.

Pastor e pastoral
            Não há muito que discutir, para o cristão, ser pastor é ser parecido com Jesus de Nazaré, que desde o início da missão até o fim, sempre se apresentou e agiu como o Pastor por excelência. Ele é, e sempre haverá de ser, o modelo para quem pretende colaborar com a Igreja no pastoreio das milhares de ovelhas que andam pelos prados deste imenso continente latino-americano, tantas vezes machucadas, perdidas e famintas. O pastor, a exemplo do Mestre de Nazaré, necessita ir ao encalço das que estão extraviadas e excluídas pela sociedade que, como o lobo feroz, devora e destrói violentamente. Sem dúvida, para continuar a missão de Jesus no hoje da história e no aqui da realidade, o Evangelho necessita de atualização. Precisa ser reinterpretado a partir de onde cada pastor está – junto das ovelhas. Não dá para esquecer que o Espírito Santo que impulsionou Jesus a ir ao encontro da ovelha perdida, já vai na frente de qualquer empreendimento pastoral. Ele está lá, esperando que o pastor o descubra e o deixe agir. Ele, o Espírito, não fala; mas quer iluminar o pastor para que proclame aí a Palavra, que é o Cristo. O pastor, então, longe de se apresentar com palavras prontas, vai para junto das vítimas de todas as espécies - em uma palavra -, junto aos pobres. Lá irá reinterpretar a Boa Notícia que Jesus de Nazaré não cansa de anunciar: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pois ele me consagrou com a unção, para anunciar a Boa-Nova aos pobres” (Lc 4,18).
            A pastoral, longe de ser um “empacotado” que vem de cima, pré-concebido nas secretarias paroquiais ou diocesanas, será experiência concreta da vida querida, amada e protegida nas mais diversas situações e desafios que o nosso mundo apresenta. Planejamento não será dispensado, mas a metodologia usada em uma pastoral convertida há de ser a que o Espírito indicar em cada caso. Conforme as pessoas, sua cultura, suas tradições, seus costumes, porém especialmente, diante dos desafios mais prementes da comunidade, à luz da Palavra de Deus, da experiência do amor vivido por séculos na Igreja, escolher-se-á o melhor método de evangelizar. Esta será a pastoral convertida.

Novos conceitos e novas posturas
            O Papa Francisco nos lembra com propriedade que a Igreja deve ser “Igreja em Saída”. Mesmo que oficialmente a Igreja deixou de lado a preocupação do proselitismo, ainda existem fortes resquícios desta prática em numerosos cristãos de hoje. Isto se verifica quando nos planejamentos pastorais se olha em primeiro lugar para aqueles que normalmente participam das celebrações litúrgicas nas igrejas, contribuem com seu dizimo, têm seu filhos na catequese, fazem encontros de formação etc., e se constata, com tristeza, que são poucos. A partir desta constatação, para aumentar o número dos “arrebanhados”, procura-se encontrar o método mais conveniente para convencer o maior número possível. É o caso do pastor que diz consigo mesmo: “graças a Deus, eu tenho a igreja sempre cheia!”, e às vezes faz comparações com as paróquias dos colegas que não têm tanta sorte assim.
            Nossos tempos exigem novos conceitos e novas posturas para o trabalho evangelizador, deixando de lado a preocupação com o proselitismo, e mais ainda a competição com outras igrejas. “A Igreja não faz proselitismo. Ela cresce muito mais por ‘atração’: como Cristo ‘atrai todos a si’ com a força do seu amor, que culminou no sacrifício da cruz, assim a Igreja cumpre a sua missão na medida em que, associada a Cristo, cumpre a sua obra conformando-se em espírito e concretamente com a caridade do seu Senhor” (Bento XVI na Missa de Inauguração da Conferência de Aparecida).
            Se amor de Cristo o levou a estar junto das vítimas de todos os tempos, e assim, com eles ir à cruz, um conceito de pastoral verdadeiramente novo que gera nova postura não pode ser outro, a não ser o de estar do lado das vítimas e dos pobres em geral, mesmo que isso leve também à cruz. Esse novo conceito e essa nova postura desafiam a todos nós, mas quem não estiver disposto a tomar sobre si a sua cruz, também não é digno do verdadeiro Pastor Jesus.
            Na história do cristianismo já surgiram inúmeras preocupações para manter a Igreja bem protegida de ataques externos. No entanto, a história também ensina que muitas vezes essas preocupações, quando não bem fundadas no Bom Pastor, fizeram grande mal. Quem, no afã de ser ortodoxo, divide, separa, exclui, marginaliza ou condena, é um dos piores inimigos da Igreja e do Evangelho. Às vezes, esse inimigos são os que parecem “piedosos” e, com frequência estão entre os que têm cargos de autoridade e poder na Igreja. Cuidemos para ter ideias e conceitos claros para nãos nos tornarmos inimigos da Igreja ou sermos cúmplices dos inimigos.
            Portanto, tanto a Igreja quanto os pastores da Igreja necessitam de conversão. E sempre de novo. O Bom Pastor é o grande ideal. No entanto, as tentações de se fazer pastor e pastorear em seu próprio benefício estão sempre presentes. A conversão é um processo contínuo de purificação e de atenção, pois o Espírito clama, não por Si (não tem voz), mas o faz pela voz das vítimas de nossas sociedades injustas e excludentes. Se Jesus aceitou a função mais baixa a que uma sociedade pode submeter alguém: a de delinquente executado por blasfêmia e subversão, também os que lhe querem servir não podem temer esta mesma sociedade e o ela lhes tem a oferecer.
Pe. Mário Fernando Glaab

www.marioglaab.blogspot.com

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