NOSTALGIAS
E SONHOS
Quem de nós nunca sentiu saudades dos tempos de criança,
de outras épocas, de outras situações? Ainda mais quando já se tem uma certa
idade, alguns anos a mais de vida; para não falar somente dos idosos.
Igualmente podemos perguntar quem de nós nunca sentiu saudades do futuro; quem
nunca sonhou com uma realidade diferente da que está vivendo? Também mais
intenso em pessoas que já estão “cansadas” dos desafios do hoje de cada dia.
São as nostalgias e os sonhos, que não são reais; apesar de sua imensa influência
na vida de qualquer um, tanto maiores quanto mais distante da vida real.
Viver
no passado
É bem mais cômodo viver no passado que no presente. Além
de se criar para o passado uma espécie de tempo perfeito; reprova-se o tempo
presente. Hoje as coisas são ruins. É uma maneira de se estar acomodado e nada
fazer para contribuir na caminhada que deve continuar. Justifica-se a própria
atitude de não-colaboração, com louvores aos tempos passados e críticas
negativas aos tempos atuais. Saudades do passado e reprovação do presente.
Essa forma de viver não é boa em qualquer relacionamento
humano, mas ela tem consequências enormes quando atinge a espiritualidade ou a
vida religiosa das pessoas. Existe um voltar ao passado nos costumes de rezar,
de se vestir, de falar e, até de se comportar como se fazia há cinquenta ou
sessenta anos atrás na Igreja: tempos pré-conciliares ou imediatamente
pós-conciliares. Pergunta-se: será que naquele tempo tudo estava certo e hoje
não está mais? Será que os costumes de então eram os ideais? Mas eles não eram
também frutos de uma determinada cultura?
Viver
no futuro
Outra tentação que desloca da realidade do presente é
sonhar com um futuro perfeito, mas que não tem suas raízes no presente.
Procura-se fugir do agora que não é bom. Quanto menos sujar as mãos hoje, tanto
mais se aproxima desse futuro sonhado. Na expressão popular se diz “viver no
mundo da lua”. A lua está hoje tão brilhante e grande, porque está cheia, mas em
alguns dias ela não brilha e nem aparece, pois está em sua fase minguante.
Contudo, certas pessoas sonham, sonham, mas nunca acordam.
Também esta forma de viver não é boa, principalmente
quando atinge certas espiritualidades. É importante esclarecer que estes sonhos
não têm nada de haver com esperança; que é uma virtude essencial na vida
cristã. Viver no futuro significa deixar
o presente, a situação do aqui e agora, de lado. Não sujar as mãos nas poeiras
da caminhada.
Viver
no presente
Viver no presente – isto vale para todas as idades –
consiste em juntar o passado e o futuro para o aqui e o agora. É contar com a
experiência própria e de outros, sonhar com o sucesso e com a graça de Deus,
mas fazer tudo o que estiver ao alcance hoje, nem que seja difícil. É atualizar
o que se crê e antecipar o que se espera na caridade concretamente vivida.
Não basta querer viver da história, mas é preciso viver
na história; não basta sonhar com o futuro, mas é preciso antecipar o futuro na
vida que se tem hoje. É neste hoje que o Espírito de Deus se manifesta e se
revela, assim como se manifestou no passado e irá se manifestar no futuro; tudo
no seu devido momento e com as devidas pessoas. Hoje é a nossa vez de
acolhê-lo.
O
hoje do pobre
O pobre – qualquer tipo de pobre – não tem muitas
nostalgias e sonhos. Ele, geralmente, tem fé e esperança que vive na caridade.
Caridade para com Deus, para com o seu semelhante e para com o meio onde está.
Ele tem saudades do quê? Sonha com o quê? Talvez tem saudades dos momentos em
que sentiu o amor de Deus mais perto através de gestos humanos que pôde
experimentar; talvez sonha em se encontrar com o Deus justo que lhe perdoe suas
fraquezas e o coloque em um bom lugar. Nada que vai muito além disso.
Todavia, tudo isso ele tenta expressar hoje com o seu
jeito de ser e de cultuar. Ele tem seus próprios ritos, sua própria maneira de
sobreviver. Não tem as mínimas condições de observar o que as instituições
exigem, nem mesmo o que os cânones da Igreja dizem. Ele faz do jeito como sabe
e como pode. Isto não quer dizer que o pobre não tenha seus ritos e suas formas
de expressar sua religião. Alguém disse que “os sacramentais são os sacramentos
dos pobres”. Penso ser uma grande verdade, pois ele não possui a clareza e as
condições que são exigidas para oficialmente receber os sacramentos; porém tem
a intenção e a vontade que superam o que está faltando. Mas, como e em que
quantidade? Só Deus é que sabe.
Se é verdade que a história é a mestra da vida, alguém
pode dizer que o pobre, por não ter saudades do passado e nem sonhar com o
futuro, tem pouco a aprender com ela. Mas, talvez não seja assim, uma vez que
para o pobre a história se concentra no presente, no hoje de suas preocupações.
É neste presente que ele aprende continuamente. É no presente que ele
experimenta o tempo, na fé, na esperança e na caridade. Assim como também a
Igreja é fruto do tempo, e que sempre precisa se atualizar, fazer-se hoje;
assim também o pobre traz a sua história, o seu tempo para hoje, e o vive com
todo o seu ser.
Que todas as nostalgias e todos os sonhos se tornem
realidade hoje para nós. É este o tempo que Deus nos dá; é este o tempo no qual
precisamos reviver o passado, preparar o futuro, contudo vive-lo intensamente
hoje no amor compromissado com Deus, com o próximo (mais necessitado) e com o
meio que nos circunda. Nada de nostalgias e de sonhos, mas pés no chão!
Pe. Mário Fernando Glaab.
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