O
GRITO DOS CONDENADOS
São tantos os gritos dos condenados que muitas vezes não
os ouvimos mais. Eles acompanham a história da humanidade desde o início, e
também hoje não deixam de ecoar por todos os lados. Há, no entanto, um grito
que é sempre atual: o grito daquele que por fazer somente o bem a todos foi
culpado pela maldade de toda a humanidade: o grito de Jesus de Nazaré.
Pai,
afaste..., mas...
Os cristãos sabem muito bem quando e porque Jesus deu
este grito. Porém nem sempre veem nele a profundidade da tragédia. Lá estava
todo sofrimento humano concentrado; lá estava igualmente toda confiança no amor
a Deus, e a esperança de que o bem venceria sobre o mal.
Jesus, como qualquer ser humano, grita diante da dor da
condenação. Ele vê toda sua ação misericordiosa, todo seu anúncio do Reino de
Deus sendo frustrado. Ele, inocente, condenado à morte ignominiosa, a mais
terrível e vergonhosa: abandonado por todos, inclusive por Deus. Pai, afaste
isso de mim, mas que não seja feita a minha vontade. É muito difícil captar a
profundidade dessa oração do Homem de Nazaré. Ela vai além de qualquer
explicação lógica, ou de qualquer compreensão humana.
A resposta a esta oração vem somente no domingo da
Ressurreição que, no entanto, só pode ser aceita na fé. Ele vive e é o Senhor.
Ele bebeu o cálice dos condenados até as últimas consequências, sofreu com
todos os condenados, e agora é o Vencedor.
Ele
me entende
Mesmo que se quer abafar o grito de tantos condenados,
seus gritos continuam a perturbar nossos ouvidos. São os gritos dos famintos,
dos doentes, dos viciados, das crianças abandonadas, dos idosos desamparados,
dos injustiçados; enfim, de todos os pobres e sofredores. Existe também hoje
todo um movimento condenatório: jogar a culpa sobre as vítimas. Elas são
culpadas; pois são todos vagabundos, comunistas, ladrões, pior ainda, são
diferentes! Os juízes são os bons (!).
Não é possível entender o que se passa quando se usa
somente a lógica humana. As vítimas sabem muito bem que os seus algozes nunca
os entenderão. Eles têm as suas justificativas. Os que assistem suas tragédias,
na maioria, ficam alheios. Mas, alguém os entende. Olhando para o Crucificado,
todos os condenados de todos os tempos e lugares, vítimas de qualquer sentença,
podem dizer, sem medo de errar: “Ele me entende!”. Que seja assim, para que a esperança não
morra no coração de ninguém, mesmo que seja o pior condenado.
Porém, fica igualmente um forte apelo para que nós, como espectadores
e membros da comunidade humana, tenhamos o olhar compreensivo. Não cedamos às
campanhas de ódio disseminadas em nossa sociedade, mas saibamos ouvir o grito
dos condenados, vendo neles o grito do Homem de Nazaré hoje e aqui. Não
esqueçamos nunca que para o cristão, Jesus é o Senhor, e mais ninguém. Seu
ensinamento é “amai-vos”, não “armai-vos”. Em consequência disso, a cruz (sofrimento,
condenação) e a tragédia humana estão entrelaçados para sempre. Sejamos
coerentes.
Pe. Mário Fernando Glaab.
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