segunda-feira, 4 de julho de 2016

Misericórdia - uma maneira de "ser".

OBRAS MISERCORDIOSAS E SER MISERICORDIOSO

Durante este ano do Jubileu Extraordinário da Misericórdia que, segundo o desejo do Papa Francisco, quer levar todos à contemplação do rosto misericordioso de Deus e à prática da misericórdia em toda a nossa existência, muito se falou sobre o tema. Porém, quero aproveitar para mais algumas reflexões.

Ser misericordioso é mais que fazer obras de misericórdia
            Certa catequista, ao explicar para as crianças a necessidade de praticar as obras de misericórdia, ficou confusa diante da pergunta de uma menina. Entre as obras de misericórdia a criança se deparou com aquela que pede a visita aos presos. “Isso eu não posso fazer, pois é perigoso; e nem sei se me deixam entrar onde estão os detentos”, exclamou ela, preocupada. “Será que eu não posso fazer o que o Papa pede de nós?” A catequista não soube explicar, uma vez que estava diante de um dilema: Deus não pode querer o impossível, mas as obras de misericórdia de fato continham também esta de visitar os encarcerados.
            As obras de misericórdia são objetivas, isto é, estão aí para todos ver. Mas, nem todos podem fazer tudo. No caso da criança, é claro que não compete a ela realizar algo para o que ainda não está apta e, mais ainda, que seria perigoso e impossível. Neste caso, a virtude de prudência equilibra as coisas. Mas não é isto que quero apresentar. Pretendo refletir sobre o “ser misericordioso”.
            Interessante observar que Jesus não prega as obras de misericórdia, mas as supõe no julgamento. Pode-se entender que elas são consequências de quem é misericordioso. Ele apenas diz que é preciso ser misericordioso como o Pai é misericordioso (cf. Lc 6,36), insiste no amor ao próximo e manda seguir o exemplo do samaritano misericordioso ( cf. Lc 10,25-37).
            Levando-se em conta as palavras e as atitudes de Jesus, é possível aprofundar a questão. Jesus mostra que a verdadeira misericórdia é compartilhar a vida. Ou dito de outra maneira, é fazer-se próximo, estar junto do outro. Este outro, no entanto, não é qualquer outro, mas é o outro que está na miséria, aquele que sofre porque lhe é negado o direito de viver humanamente. O miserável é aquele que não tem acesso à vida, conforme Deus quer, isto é, não pode ser verdadeiramente humano. O que possui misericórdia faz-se próximo do miserável e lhe compartilha o coração – aproxima-se com amor. Como o samaritano, o misericordioso irá encontrar uma saída para o caído à beira do caminho da humanidade. As várias obras de misericórdia são frutos do misericordioso. Cada situação terá as “saídas” mais convenientes, conforme a prudência o exige.

Agir com misericórdia é reagir diante da dor e da injustiça
            Quem se preocupa apenas com as obras de misericórdia pode permanecer a vida toda querendo fazer o bem, mas falta-lhe uma verdadeira conversão. Não é fundamentalmente misericordioso.
            Ser misericordioso no profundo do ser significa que a misericórdia, como qualidade da pessoa lhe serve de princípio. É parte de seu fundamento. Deus é misericordioso por natureza; o ser humano, para ser verdadeiro humano, necessita se construir sobre este fundamento que lhe vem de Deus. Isso, em outras palavras, quer dizer que a misericórdia está lá onde está a pessoa. Quando a pessoa misericordiosa entra em contato com o povo sofredor, ela não fica em meros sentimentos. Ela reage. Deus escuta o clamor do povo oprimido e vem-lhe ao encontro para libertá-lo, isto encontramos no Antigo e no Novo Testamentos. O próprio Jesus veio para salvar o que estava perdido.
            O misericordioso, antes de pensar em obras de misericórdia, diante da dor do outro, reage para transformar a realidade. Eliminar o mal e implantar o bem. Procura caminhos de solução. Nesse processo não teme denunciar as causas da dor nem exigir justiça em nome e para os sofredores. A dor alheia, que o toca interiormente, desencadeia a reação misericordiosa que não se acalma enquanto não transforma a dor em bem-estar; mesmo que isso envolva denúncia, luta e que cause sofrimento. É desta reação que surgem as diversas obras, que por sua vez são tentativas para concretamente solucionar a situação na qual se encontra o sofredor. O misericordioso vai utilizando as obras conforme o momento, e, é claro, dentro dos critérios da prudência. Não comprometer um bem maior com uma solução momentânea que pode trazer mais complicações (como seria o caso da criança que fosse visitar os presos).
            Portanto, a misericórdia, como princípio do ser-cristão, define toda a sua existência. A misericórdia define o seu ser ao ponto de fazer parte integral de sua pessoa. É sempre princípio ativo de reação ante qualquer realidade negativa que faz sofrer. Assim, ser cristão é agir com misericórdia; caso contrário, todas as obras são apenas superficiais, não transformam nada.
            A esta altura dá para entender porque a sociedade tolera, e até elogia, as obras de misericórdia; mas não suporta a misericórdia. Já Dom Hélder Câmara dizia que quando dava esmola para os pobres era considerado santo, mas quando apontava os motivos da pobreza (reagia diante das causas da pobreza) era considerado comunista. Então, ser misericordioso como o Pai do Céu é uma meta que parece muito distante, mas queremos sempre de novo recomeçar o caminho. Lembremos que a distância que nos separa do irmão sofredor, que caminha ao nosso lado, pode ser grande, mas se estivermos atentos, poderemos transpô-la. Certamente nos tornaremos apáticos e até contrários aos interesses das classes dominantes, mas é por aí que vai a boa notícia do Evangelho.

Pe. Mário Fernando Glaab

Dialeto alemão do sul do Brasil - Hunsrick

DIE BLUME BRAUCHE NET SCHEN SEN WEIL SIE ES JO SCHUN SEN

Vielmols passiat bei de gute Leit in unsa Kolonie des ma enfach spiert dass was ma lebt etwas Gutes is. So oft mache die Leit Sache wo die gelehrte Mensche iwahaupt net bekeppe. So orme un net gelernte Koloniste hon doch vielmols mee gute Sache im Hetz wie die wo doch blos Wille hon awa kei Finga krum mache fa etwas Gutes tun. Wenn in unsa gute Kolonie mol ene krank is oda hot en Problem, do tun doch gleich die Nochbaschleit sich samme mache, un helfe.
Mea hatte en eltere Mann in de Gechend, dea hot so vieles Gutes getun; hot ach de Leit viel Guteswort gewe, un alles interpretiert, un en gute Sinn rausgehol. Ea is mo gefrot gep wie das wea des die enfache Leit so Gutes un Schenes mache tere, un die Grossartiche doch blos Schweinerei samme brenge tere? De gute Mann hot net lang nogedenkt, hot dan mo parlamentiert: “Das is so: die Blume brauche net schen sen, weil sie es jo schun sen”. Dan hot ea es erklert: “Die orme Leit vun unsa Kolonie, die brauche sich net gut un schen mache, weil sie es jo schun sen. Unsa Leit hon das Gutes un das Schenes insich. Die Grossartiche hon jo doch blos schlechte Gedanke im Kopp, wolle die Annere ausnutze un oanscheisse mit erre Geschefte. Ma muss sich hite von so Mensche, un muss imme zusamme halle. Dan bleibt Gott bei uns un kei Gaune kann uns klein mache.
Orich schen Baispiel. Wenn die Juchend das oach heit bekeppe tet, dan wer die Welt doch noch besse.

Glaabsmário.

sábado, 2 de julho de 2016

Deus ama gratuitamente.

Gratuidade do amor de Deus por nós

            Sentir-se abandonado por Deus é desesperador. Qualquer criatura não amada por ninguém, nem mesmo por Deus, entra em desespero. Nada mais a sustém. Ela morre, uma vez que não faz sentido viver assim.

Contradição lógica
            O Novo Testamento traz dois textos que parecem se excluir mutuamente. Um diz: “Nós que cremos, reconhecemos o amor que Deus tem para conosco” (1Jo 4,16); o outro, de Jesus moribundo, traz o grito: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Mc 15,34). Não seria este uma afirmação de falta de fé em Jesus no auge de sua entrega pela sua causa? A lógica pura não funciona. Por traz destas palavras inspiradas fala mais alto, não a lógica, mas o amor vivido e experimentado na fé.
            Ao se dizer que o amor de Deus é reconhecido pela fé, sabe-se que foi esta a experiência de Jesus e de seus discípulos em todos os tempos. Também hoje. Quem não adere, comprometendo-se com Ele, nunca vai reconhecer o mistério deste amor. Deus, em Jesus ama gratuitamente. Exclui os méritos, a observância das leis, das normas ou da religião, mas para todos tem uma mensagem de paz. À medida em que alguém se deixa tocar por Jesus é envolvido na experiência do amor de Deus, que não se explica com palavras e argumentos humanos. No grito de Jesus coloca-se o confronto com o máximo da miséria humana. O abandono de tudo e de todos. Não se justifica o grito! Contudo, no mais profundo da miséria experimentada por Jesus, naquele momento dramático da cruz, vislumbramos a mais pura fé, a mais esplêndida confiança. “Meu Deus, meu Deus, por que...?” Somente pode gritar assim, nas condição desse abandono, quem viveu, vive e viverá sempre na confiança de que Deus estava e estará presente. O abandono é ausência, mas de Alguém que, com certeza, estava aqui, e, que o estará novamente. Alguém que escuta, apesar de não se vê-lo e senti-lo. É morte física, sim; morte para Deus, não; desespero humano, sim; desconfiança no Pai, não.

Amor gratuito
            O mundo tem muita dificuldade para crer no amor de Deus. Mentalidade esta que afeta também as religiões, que ensinam, com seus preceitos, sua moral, suas leis, como se deve proceder para ter a bênção e as graças de Deus. Aquele que faz tudo conforme as regras da religião será amado por Deus. A partir dessa visão se estabelecem critérios para avaliar as religiões como mais ou menos eficientes. Provas de eficiência são bem-vindas!
            Deus, no entanto, age diferentemente. Ele não se submete aos critérios dos sábios e dos prudentes ou poderosos deste mundo. Ele se revela como o Deus que é “só-amor” nos e pelos pequenos e humildes (cf. Mt 11,25-26). Faz com que estes experimentam gratuitamente seu amor, não porque são melhores que os ricos, sábios e poderosos, mas porque lhe estão mais disponíveis. Creem mais facilmente porque não têm os muros do orgulho (bens, sabedoria humana, força e poder) trancando o espaço interior – o coração – de sua vida. Deus ama gratuitamente, oferece os segredos de seu amor. Aquele que crer, experimenta e, consequentemente participa do círculo amoroso. O amor de Deus é para que o ser humano possa amar. Deus pede o que dá e dá o que pede.
            A gratuidade do amor do Pai surpreendeu até mesmo a Jesus. Jesus bendiz ao Pai, surpreso, por fazer o contrário daquilo que todos fazem. Para Jesus a eleição dos simples e pobres para experimentar “estas coisas” já é parte dos mistérios do Reino de Deus. Quem sabe acolher o amor gratuito de Deus, como os simples e os pobres, estará colaborando na atualização do Reino definitivo de Deus; onde prosperará somente o amor.

Pe. Mário Fernando Glaab