quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Dízimo é gratuito

DÍZIMO E GRATUIDADE DE DEUS

            Apesar de todas as explicações e reflexões que se fizeram nos últimos tempos, pode parecer que os dois conceitos – dízimo e gratuidade de Deus - não se harmonizam totalmente. Mesmo que a Pastoral do Dízimo, nas últimas décadas, tenha insistido enormemente para mostrar que o dízimo não é “pagamento”, mas oferta de amor, ainda permanece certa dúvida e até convicção, talvez escondida no profundo de nossa religiosidade, de que o dizimista fiel recebe mais bênçãos que o não-dizimista. Aliás, se Deus é justo, justiça se faz. O Deus da Gratuidade sem limites para com todos é outro assunto, que não convém abordar quando se fala de dízimo. Mas, vejamos.

Jesus e a generosidade
            Na verdade, a ideia de que Deus dá a suas bênçãos aos bons dizimistas é veterotestamentária. Jesus nunca ensinou isso. Jesus, em toda sua pregação e nos seus feitos, anunciou uma ilimitada confiança no Pai que não faz distinção entre seus filhos. Conforme Jesus, o Pai do Céu faz o sol nascer sobre os bons e os maus, chover sobre justos e injustos (cf. Mt 5,45), pois todos estão incluídos no seu amor paterno. O que Jesus anuncia e instaura é uma nova realidade, onde todos têm acesso à misericórdia de Deus. Onde a vida é valorizada naquilo que é: dom de Deus. É, em outras palavras, o Reino de Deus na terra. Neste Reino há abundância para todos, pois será vida em plenitude.
            A tarefa da Igreja, mãe generosa, é ser sinal eficaz do Reino de Deus no mundo, para que todos possam ter acesso à vida plena. Quem a experimenta, ou melhor, a vivencia a vida em plenitude, não pode mais se fechar no egoísmo que quer tudo para si. Abre-se para compartilhar com todos o que encontra no Reino. Abandona qualquer iniciativa de comércio ou barganha com relação a Deus ou ao próximo. Seu partilhar é pura generosidade. Acolhe o Reino com simplicidade; compartilha os bens na visão do Reino generosamente sem esperar nada em troca. Toda doação é fruto da pertença ao Reino, ou melhor, o Reino do Pai é a base de qualquer gesto cristão que assim se torna gratuito, como é gratuito o Reino.
            Deus não se deixa vender e nem ser comprado. Não aceita oferendas manipuladoras, mas se dá com alegria aos pequenos e aos pobres. Aliás, Jesus o louva por isso, ao exclamar: “Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequenos. Sim, Pai, assim foi do teu agrado” (Mt 11,25). O louvor de Jesus é a revelação da alegria do Pai. À medida em que o ser humano começa a entrar na ótica de Jesus, ele igualmente sente alegria ao se poder doar. Estas são coisas que o mundo não consegue entender, pois são escondidas aos sábios; não porque Deus as escondeu, mas porque ele tem outros interesses. O que procura não confere com o que os pobres e pequenos buscam. Ele corre sofregamente atrás de bens materiais, do dinheiro, do poder, da fama e do prazer. Os filhos do mundo estão anestesiados diante dos valores do Reino.

Dízimo é sinal do Reino
            Tendo como base a gratuidade com Deus nos oferece a participação em seu Reino, podemos apresentar o dízimo na visão cristã. Ele não é recomendação, ou mandamento de Jesus. É bem mais do que isso. É fruto autêntico do único mandamento de Jesus, o amor. Aquele que ama é do Reino. No Reino a vida é partilhada.
            Dar o dízimo na comunidade de fé e de vida, nada mais é que compartilhar o Reino que buscamos e que recebemos gratuitamente de Deus e dos irmãos. Dar o dízimo para que a comunidade tenha condições de existir é aprender sempre de novo a realidade nova do Reino de Deus. Não se mede a generosidade pelo valor pecuniário do dízimo, porém pela consciência da pertença do fiel ao Reino de Deus. Uma vez que no Reino de Deus há vida para todos, o dizimista colabora com sua generosidade na construção da vida do Reino em sua comunidade.
            Portanto, o dízimo cristão não é uma forma sábia que a Igreja encontrou no decorrer dos séculos para sobreviver e para adquirir as bênçãos e graças de Deus em favor dos seus fiéis, mas é partilha generosa com os irmãos da comunidade, resposta generosa de quem experimenta e vive a gratuidade de Deus na construção do Reino em meio os desafios do mundo. Mesmo que a sociedade em geral prega o egoísmo, o consumo desenfreado, a falcatrua, e tudo o mais que divide as pessoas, o dizimista continua testemunhando as coisas “escondidas aos sábios e entendidos” mas reveladas aos pequenos, os benditos do Pai, o amor generoso que sabe se doar como Deus se doou em Jesus.

Pe. Mário Fernando Glaab

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