SER
PARA O POBRE, ESTAR COM O POBRE OU SER COMO O POBRE
Está em moda dizer que é preciso se converter para Jesus.
Isso se ouve frequentemente entre todos os tipos de cristãos, tanto entre
evangélicos quanto entre católicos, alguns o fazem até fanaticamente. Pode-se
perguntar sobre que Jesus se entende quando se faz essa afirmação. Trata-se de
Jesus que resolve todos os meus problemas, porque é o Senhor glorioso, ou
daquele Jesus que, conforme os evangelhos, optou pelos últimos da sociedade,
pelos doentes, pelos excluídos, pelos pecadores e todo tipo de pobres?
Converter-se para qual deles?
No início da quaresma e no rito da
imposição das cinzas na abertura desse tempo litúrgico, ouve-se o apelo de
Jesus “Convertei-vos e crede na Boa Nova” (Mc 1,15); de que conversão está falando
Jesus? Reflitamos um pouco.
Converter-se e crer
Converter-se e crer exige decisão e
esforço contínuos. Conforme os evangelhos, conversão consiste em redirecionar a
caminhada. Tomar outro rumo. Se antes se avançava em uma direção, agora é
preciso seguir em outra – seguir o Mestre Jesus. Mas para que isto seja
possível, é necessário deixar tudo o que motivava a caminhada anterior. É uma
questão de valores. Renunciar aos valores que orientavam a vida, e aderir a
novos valores, os de Jesus. O que sustenta esta mudança não pode ser outra
coisa a não ser fé. Fé, não em alguma coisa, mas no próprio Jesus. Caso antes
se seguia um cristo que prometia vida fácil, honras, sucessos e muitas bênçãos,
e ainda a certeza de que um dia se vai para o céu; agora é preciso ser
discípulo de um Jesus que anda pelas estradas empoeiradas da Palestina e se
entretém com os indesejáveis doentes e malditos que encontra à beira do
caminho. Ouvir dele as duras palavras que se alguém quer segui-lo deve renunciar
a si mesmo e tomar sua cruz cada dia (cf. Lc 9, 23), e não retroceder.
Portanto, converter-se e crer, significa concretamente,
voltar-se para Jesus de Nazaré (atualizando-o para os dias atuais e para a
realidade religiosa, social e política de hoje), segui-lo humildemente, crendo
que somente ele pode nos mostrar e fazer experimentar o que Deus quer de nós.
Crer em Jesus é se calar diante dele, deixar que ele fale, que ele mostre, que
ele seja o Mestre. Aquele que se aproxima de Jesus para, antes de tudo, falar do
que precisa, do que espera e do que Deus deve fazer com os outros, ainda não
conhece Jesus de Nazaré proclamado pelos evangelhos e pela Igreja; e muito
menos, acredita nele.
Jesus,
o pobre
Não adianta tentar esconder o sol com a peneira. Jesus de
Nazaré não é alguém que gosta dos pobres, mas ele é o pobre. Jesus de fato se
identifica com os irmãos e irmãs menores (os pobres de todos os tipos): “Todas
as vezes que fizestes alguma coisa a um destes mais pequenos, que são meus
irmãos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,40). Isto deve estar claro para todos,
e não pode deixar de examinar a consciência de cada cristão. Eles, os pobres,
serão os juízes definitivos, uma vez que Jesus se identifica com eles, e a
atitude face a eles decide o futuro do ser humano (cf. Mt 25,45). Pode-se
afirmar que, rejeitando o pobre, rejeita-se o Cristo crucificado, pois ele é o
crucificado por ser o pobre e por ter defendido todo tipo de pobre.
A partir do seguimento de Jesus-pobre, pode-se chegar a
três atitudes: uma primeira que volta a pessoa para o pobre. Isto é, atende
algumas necessidades dele dando esmolas. É o que normalmente se chama de
assistencialismo. É um mínimo de caridade; mas deixa o sujeito em sua situação
cômoda sem precisar mudá-la. Não é conversão.
Outra é a de quem está com o pobre. Partilha sua
caminhada, seu modo de rezar e também de conviver. É, sem dúvida, um modo de
amor solidário. Transporta a pessoa para o mundo do pobre e, ele chega a
experimentar em sua pele o que os pobres e miseráveis sentem em suas
necessidades mais básicas. Existe, todavia, uma terceira atitude: a de Jesus
mesmo. É a daquele que não somente se volta para o pobre; não está com o pobre,
mas é pobre. Este é o bem-aventurado que tem a graça de despojar-se de tudo
interior e exteriormente para viver com o estritamente necessário. Somente este
pode-se alegrar como os pobres se alegram (Jesus se alegrava com os campos
floridos, com as crianças e com o Pai que cuida de tudo e de todos); sofrer
como os pobres sofrem, e rezar como os pobres rezam.
Viver assim, como Jesus-pobre, não é fácil, mas é graça
do Espírito: um verdadeiro carisma. Que bom seria os que almejam por carismas
tivessem esta consciência, e se optassem verdadeiramente por Cristo e pela
Igreja dos pobres. Se dessem este testemunho ao mundo, e se vivessem “a alegria
do Evangelho” sem máscaras e sem pretensões mundanas.
Jesus Cristo, encontrado no pobre concreto de nossas
ruas, é sacramento de salvação. Ele, acolhido, seguido e vivido, levará para a
intimidade do próprio Deus. Abrirá as portas do Reino da Trindade Eterna. Foi
Jesus quem o ensinou com palavras e exemplos, mas principalmente, vivendo pobremente,
e, vindo hoje ao nosso encontro no pobre.
Doar-se
ao Pobre
Converter-se a
Jesus é bem mais do que dizer eu o encontrei quando fui a determinada igreja.
Converter-se a Jesus consiste em assumir o seu projeto de vida, a sua maneira
de ser. Portanto, consiste em doar-se como ele se doou: ao pobre, todo inteiro.
O primeiro passo, no processo de conversão, deve ser a
conversão da mentalidade: se Jesus é o pobre, nem todos os pobres são
vagabundos! Depois vem os atos: nunca afastar o olhar do pobre; nunca negar uma
palavra de consolo; nunca deixar de lhe estender a mão; nunca deixar de lhe dar
alguma coisa, por mínima que seja (talvez somente um sorriso). Aquele que
infalivelmente pretende encontrar o Cristo vivo e verdadeiro deve compartilhar
a vida com os pobres. O pobre abre a porta para o céu.
Pe. Mario
Fernando Glaab
www.marioglaab.blogspot.com
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