O
CRISTÃO E A CRUZ DE CRISTO
“Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome
sua cruz, cada dia, e siga-me” (Lc 9,23). Estas palavras ditas por Jesus
resumem toda a sua missão e, convidam os discípulos a orientarem-se para uma
nova maneira de ser e de agir. Assumirem a mesma missão.
Cristão
longe da Cruz
A linguagem da cruz sempre encontrou resistência, mas as
palavras de Jesus continuam firmes pelos séculos dos séculos. Assim como Pedro,
as comunidades primitivas, e tantos depois deles se escandalizaram diante da
cruz; também hoje os cristãos são tentados a evitar ou amenizar a cruz de
Cristo. Existe, infelizmente, uma onda de marginalização da cruz, e isto também
dentro de grupos cristãos, e até entre movimentos, pastorais e ministros da
Igreja. Tudo parece muito bonito: a cruz é enfeitada e toda a sua dureza é
escondida. Busca-se o sucesso, a prosperidade; e a cruz perde seu simbolismo de
renúncia, de luta e de morte, para se tornar objeto de proteção, amuleto, e até
de beleza. O poder de Deus – amor até as últimas consequências – já não conta,
porém é a superstição que envolve a cruz.
Cada vez mais, nos dias de hoje, a cruz e o Crucificado
são negados e renegados, até mesmo pelos cristãos. Basta lembrar os discursos
entusiásticos de pregadores que vivem longe dos compromissos com o Crucificado;
as teorias psicológicas que eliminam qualquer culpa e, consequentemente o
arrependimento sincero, a ambição por poder, glória e reconhecimento...
Cristão longe da Cruz de Cristo é impossível! Isto não existe.
A Igreja no seu discipulado, e em cada indivíduo, tem sua eficácia missionária
da presença profunda da cruz de Jesus de Nazaré. O cristão sem a cruz de Jesus
é mentiroso e sua missão não é a missão da Igreja de Cristo. A consolação não
há de faltar, mas será sempre a consolação que vem de Deus que prometeu, em
Jesus, estar presente até o fim dos tempos. “A Igreja peregrina caminha entre
as perseguições do mundo e as consolações de Deus, anunciando a cruz do Senhor
até que ele venha” (LG 8).
A
cruz e o ministério da Igreja
A Igreja, “sacramento universal da salvação” (LG 48),
realizando no tempo a obra de Cristo salvador da humanidade, não pode deixar de
carregar a cruz de Jesus. Assim como Jesus foi incompreendido, perseguido e
morto, também ela o é, à medida em que é coerente com seu Mestre. Na sua missão
de levar vida e salvação ao mundo, denunciando o pecado que destrói e mata, ela
toma sobre si as dores e os pecados que afligem a humanidade. De fato, todos
deverão ver na Igreja Aquele que foi crucificado, para que crendo nele não
pereçam, mas tenham a vida eterna (cf. Jo 3,14). Isto será possível se a Igreja
não tiver medo de tomar a cruz e segui-Lo.
Nunca será demais lembrar que a Igreja não é uma entidade
abstrata representada por uma grande multidão, mas é uma comunidade real de
homens e mulheres concretos. Pessoas que vivem nos altos e baixos da história:
santos e pecadores. Também nós, cada um de nós que cremos, os batizados,
crismados, alimentados pela Eucaristia e pela Palavra de Deus, mas igualmente
vítimas das fraquezas, limitações e pecados como toda a humanidade, somos a
Igreja: Igreja santa e pecadora. Nós carregamos a cruz do Redentor, mas não
podemos negar o fato de sermos responsáveis por torná-la tão pesada e dura ao
Senhor e à sua Igreja. São Francisco de Assis, falando sobre a responsabilidade
que cada um tem diante da Cruz, assim se exprime: “Nós cristãos, que
proclamamos conhecê-lo, e não obstante, o negamos com os fatos, de alguma forma
real estendemos nossas mãos contra Ele. Tão pouco os demônios o crucificaram.
Foste tu, junto com eles, que ainda o crucificas, deleitando-te nos teus vícios
e pecados” (Admonitio 5,3).
A Igreja, com a palavra da cruz, no viver crucificada e,
portanto, anunciando a cruz desde a cruz, faz acontecer na história, com todo o
poder de Deus, a reconciliação e a nova vida.
A
cruz como julgamento divino
A cruz, com tudo o que contém, em seu amor sem limites,
revela o julgamento de Deus sobre o pecado e a morte. “Aquele que não conhecera
o pecado, Deus o fez pecado por causa de nós, a fim de que por Ele nos tornemos
justiça de Deus” (2 Cor 5,21). O mal foi vencido pelo bem. O pecado foi
condenado na morte do Filho de Deus; e, continua sendo condenado em todos os
que seguem o Filho carregando Sua cruz até o fim, por amor. A doação voluntária
de Cristo para tirar o pecado do mundo configura-se hoje na história do mundo
onde o cristão assume a sua vocação e missão: ser sal da terra e luz do mundo.
Fixando os olhos no Crucificado, podemos dizer: Senhor
Jesus, o nosso olhar está voltado para vós, cheio de vergonha, de
arrependimento e de esperança. Que diante do vosso supremo amor (na cruz) nos
invada a vergonha por ter-vos deixados sozinho a sofrer pelos nossos pecados. A
vergonha de termos corrido diante da provação, apesar de termos dito milhares
de vezes: ainda que todos vos deixem, eu nunca vos deixarei. A vergonha por ter
perdido a vergonha (cf. Oração de Francisco na sexta-feira santa).
Pe. Mário Fernando Glaab
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