sábado, 15 de setembro de 2012

Animação Bíblica

SEGUIR OU ESTAR NO LUGAR DE
Pe. Mário Fernando Glaab
            De “discípulos e missionários” passou-se para “discípulos e servidores da Palavra”, e isto “na missão da Igreja”. Estou falando da passagem do acento que o Documento de Aparecida deu à evangelização para o acento que a CNBB deu no Documento 97 para a animação pastoral.
            Tanto um como outro, são acentos extremamente importantes e urgentes. É, no entanto, mais que necessário que se leve em conta alguns aspectos que essas visões ou propostas contêm. Os conceitos de discípulo e missionário, na visão evangélica, unem intimamente a um personagem protagonista que não pode ser outro, a não ser Jesus de Nazaré: o Mestre. Ser discípulo de Jesus significa segui-lo na sua maneira de ser. Quando o Mestre fala, ouvi-lo, quando age, agir com ele, quando caminha, caminhar com ele, quando ensina, aprender com ele etc. Ser missionário de Jesus significa levar, como enviado dele, a mesma experiência discipular ao mundo; para no mundo, à voz do discípulo se ouça Jesus, na ação do discípulo se encontre a ação de Jesus, no caminhar do discípulo, o caminhar de Jesus, no ensino do discípulo, o ensinamento de Jesus. Ele, também no trabalho missionário do discípulo, continua sendo o Mestre. Da mesma forma, falar evangelicamente de servidores da Palavra, não tem outra conotação que afirmar docilidade à Palavra, escutando e praticando; fazendo com que ela se torne vida, por isso, leitura orante. E, a missão da Igreja, tal qual a missão do discípulo-missionário, não é outra que levar a todos a obra de Jesus de Nazaré, suas palavras e seus feitos.
            Apesar da satisfatória insistência nos documentos da Igreja, tanto da Igreja universal como da CNBB, parece que muitas pessoas preferem, ao invés de seguir o Mestre, estar no lugar do Mestre. Esquecem que sempre devem estar no seguimento, uma vez que sempre continuam limitados e carentes de aprendizado. É a condição própria de cada ser humano, limitado pela finitude do criado. Ao se posicionar no lugar de Jesus, estas pessoas procuram justificar um falso discipulado, algo que já teriam alcançado em plenitude. Colocam-se na condição do Mestre. É bom lembrar que quando Pedro quis “ensinar” a Jesus, este o manda para trás de si (cf. Mt 16,23). Quando isso acontece, os missionários-não-discípulos, ao invés de animar, ameaçam. Ameaçam porque se julgam melhores do que o resto dos humanos. Pensam que já alcançaram a posição do Mestre, e que estão autorizados para tirar os ciscos dos olhos do próximo, ou pior ainda, atirar pedras nos ainda não “convertidos”. Os bispos, ao propor que toda a pastoral seja animada biblicamente pela Palavra de Deus, não estão sugerindo que os animadores se apresentem como os tais, mas que, na humildade e sinceridade, reconheçam tudo de bom que existe no mundo e nas pessoas, e que se disponham em colaborar com qualquer iniciativa que, como fez o Mestre de Nazaré, favoreça a vida, a começar pela vida dos pobres, dos ofendidos e humilhados da história. Animar biblicamente a pastoral é inconcebível sem conversão sincera e duradoura do animador.
            A partir dessa reflexão pode-se concluir que a Igreja, como cada cristão, precisa seguir com mais humildade ao seu Mestre para poder cada vez mais, como ele, exercer o profetismo; deixando em segundo plano sua política de imposição ou de vencimento. O que o mundo de fato necessita no dia de hoje é que cada ser humano - os cristãos estão nesse mundo e fazem parte da humanidade – colabore com a vida de tudo e de todos. Quando a Igreja ou os cristãos perdem a dimensão do serviço perdem também a dimensão do Reino de Deus que está em processo de instauração no mundo. O Cardeal Martini (Milão), falecido há pouco, disse em uma das últimas entrevistas, após uma vida de muita doação pela renovação da Igreja: “(A Igreja) é pouco capaz de servir às exigências do mundo de hoje. Pensa demais em termos políticos sobre como vencer, e assim perde a capacidade profética” (Entrevista a Aldo Maria Valli, em fev/11). Essa preocupação do “como vencer” é típica de quem se julga no lugar de Jesus, porque já alcançou a altura do Mestre. Aí é que mora o perigo. Ninguém é melhor que ninguém. O chamado de Jesus para que o sigamos no caminho da santidade, carregando cada um a sua cruz, é para todos; e, esse caminho certamente levará à morte para somente então, ressurgir para a Vida Nova.
            O melhor testemunho para que o mundo possa crer é o testemunho do seguir o Mestre, não o do estar no lugar do Mestre.

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