A
IGREJA E SUA MISSÃO: O REINO
Não é difícil encontrar pessoas preocupadas com uma
suposta crise pela qual, segundo eles, a Igreja católica está passando em
nossos dias. Dizem que cada vez mais diminuem os que fazem parte dela, ou que
de fato são seus membros. Porém, não estão muito preocupados com o trabalho da
Igreja no mundo. Por outro lado, surgem cada vez mais igreja e igrejas. Pululam
por todos os lados pequenos grupos que se dizem cristãos, mas que confessam sua
fé, não em comunhão com a Igreja católica, mas cada qual, de seu jeito em
comunidades separadas. Rezam e louvam a Deus, celebram e vivem sua vida,
procurando inspiração em Jesus Cristo, mas não na tradição da Igreja católica.
Há quem se perturba com isso, e, como os discípulos de Jesus, gostaria de
proibir que “eles ajam assim” (cf. Mc 9,38). Tem tanta gente “expulsando
demônios” por aí afora, mas “não anda conosco”! Afinal, perguntam: onde está a
verdade? Podem fazer isso? Não é somente a Igreja católica quem tem o poder de
salvar?
Igreja
e Reino
Não querendo justificar, de forma alguma, as muitas
divisões entre os discípulos do único Mestre – que é vergonhoso -, será bom,
apesar de tudo, fazer a distinção entre Igreja e Reino. O Reino de Deus que
Jesus veio trazer, é bem maior que a Igreja. A Igreja, por sua vez – comunidade
dos seguidores de Jesus -, está, como Jesus, ao serviço do Reino. Nunca o
contrário.
Quando os discípulos viram aquele homem libertando as
pessoas do mal sem estar com eles, sem fazer parte de seu grupo, se revoltaram.
Proibiram o desconhecido de fazer o bem. Mereceram, no entanto, uma reprimenda
de Jesus: “Quem não está contra nós está a nosso favor. Não o proibais”. Eles
estavam restringindo a ação libertadora de Deus ao seu pequeno grupo. Deus, no
entanto, conforme Jesus ensina e age, não se deixa prender na pobre ação de um
pequeno grupo. Todas as pessoas de boa vontade são convidadas a colaborar na
eliminação do mal e na construção de um mundo mais humano, mais justo e
fraterno; onde todos têm acesso à vida, onde ninguém é obrigado a ficar na
margem da existência. É justamente nas “periferias” da existência que se veem
os sinais da ação do Espírito de Deus atuando. Talvez seja este um dos sentidos
da promessa que as mulheres ouvem ao se encontrarem com aquele jovem sentado no
túmulo onde Jesus fora sepultado: “... ele irá à vossa frente, na Galileia. Lá
vós o vereis” (Mc 16, 7). Na Galileia, periferia do mundo judaico, as coisas
acontecem. Lá os discípulos deverão se encontrar com o Ressuscitado. Sem
dúvida, não é lá o centro religioso de então.
Mas, vamos ao que interessa, a Igreja não pode ser
confundida com o Reino. Ela sempre deve estar ao serviço do Reino. E, tudo o
que é bom, esteja onde estiver, é ação do Reino de Deus; e a Igreja não o pode
proibir. Ela precisa apoiar e somar. Claro que pela consciência de que Jesus
deixou uma comunidade bem unida, que se alimenta na força do Espírito de amor,
a Igreja sempre zela pela sua unidade. Alegra-se por cada membro que, na
fecundidade de seu seio materno, gera para atuar no mundo; mas não pode ir
contra os que fazem o bem fora dela. Concretamente, fora da Igreja católica
existe no mundo um número incontável de homens e mulheres que fazem o bem e
vivem trabalhando por uma humanidade mais digna, mais justa e mais libertada. A
Igreja deve ver; e mais, ensinar, que também aí está vivo o Espírito de Jesus.
Estas pessoas não são adversários, mas amigos e aliados. Não existe um só
combate pela justiça – por mais equivoco que seja seu pano de fundo político –
que não esteja silenciosamente em relação com o Reino de Deus, embora os
cristãos, às vezes não o queiram saber. Onde se luta pelos humilhados, pelos
esmagados, pelos fracos, pelos abandonados, ali se luta em favor do Reino de
Deus. Deus está atuado no mundo.
Igreja
católica e igreja cristãs
O primeiro desafio, tanto para os católicos como para os
evangélicos, é na verdade o de evitar fanatismos. O fanatismo é veneno! Ninguém
é melhor que ninguém. Se aqueles discípulos foram repreendidos pelo divino
Mestre por se julgarem melhores do que o desconhecido que “expulsava demônios”,
o que dizer de nós, hoje? Sejamos humildes! Portanto, o fanatismo é arrogância,
ele fecha as portas para a ação do Espírito de Deus fora do pequeno grupo que
se julga seleto. Deus, porém, ama a todos indistintamente. E, muito menos, fica
limitado para dar suas graças a alguém por não ser deste ou daquele grupo;
desta ou daquela igreja. Pensar assim, é projetar em Deus nossas mesquinhas
ideias. Fazer de Deus um deus que pensa e age como nós; não o Deus que nos quer
todos bem perto dele para nos instruir conforme o seu coração.
O segundo ponto a ser levado a sério com relação às
muitas igrejas, há de ser o interesse para que na mútua-ajuda de todos, a
humanidade seja salva; ou que os “espíritos maus” sejam expulsos numa ação
conjunta. Que os cristãos, de qualquer confissão, saibam trabalhar para o bem
da humanidade na forma de fermento na massa. Saibam somar com todas as pessoas
de bem.
Concluindo
Se existe crise, ela está aí para ser vencida. Querer,
todavia, vencer a crise somente com as parcas forças de um grupo pode ser
arriscado. Melhor será deixar que a Palavra de Deus ilumine. E, conforme vimos,
ela ensina que a crise da Igreja católica (se de fato ela existe e é real) será
vencida se os membros da mesma Igreja tomarem consciência que necessitam
trabalhar em conjunto com todas as pessoas de boa vontade; a começar com os
irmãos cristãos de outras confissões, e, continuar com todos os homens e
mulheres que sinceramente trabalham pelo bem da humanidade.
Ainda: a crise pela qual passa hoje a Igreja católica é
uma oportunidade para que nós, seus filhos e membros, como seguidores de Jesus,
recordemos que nossa primeira tarefa não é organizar e desenvolver com êxito
nossa própria religião, mas ser fermento de uma nova humanidade onda exista
vida e justiça para todos. Foi o que a Campanha da Fraternidade propôs durante
a quaresma e por todo o ano de 2015.
Pe. Mário
Fernando Glaab
www.marioglaab.blogspot.com
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