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NATAL E OS POBRES
Existem dois natais. Um é o natal que se comemora com
festas, presentes, com enfeites e até com abusos de toda sorte; que é fruto do
consumismo exagerado. Outro é o Natal cristão que se volta para o Menino que
nos foi dado: o mistério da Encarnação do Verbo de Deus na pessoa de Jesus de
Nazaré, e que é celebrado na fé, na esperança, e principalmente no amor.
Natal
pagão
O natal criado pelo consumismo é o natal pagão. Não tem
nada, ou ao menos, muito pouco, de haver com o Natal cristão. Ele valoriza o
prazer, o ter e o consumo exagerado. Por isso, não tem escrúpulos em descartar
tudo o que impede de alcançar estas coisas. Quem não pode competir, é excluído.
Os pobres e os sofredores são “apagados” das imagens desse natal, pois as luzes
o fazem brilhar como se fosse de um outro mundo, um mundo de fantasia.
Este mundo que celebra o seu natal é tão perverso que,
para não estragar o seu esplendor, incentiva as pessoas a se desculparem –
desencargo de consciência -, fazendo alguma obra de caridade em prol dos
miseráveis. Se o pobre tiver uma cesta básica no natal ele não estraga o brilho
da rica ceia dos abastados pagãos. Durante o resto do ano não lhes interessa saber
se ele tem algo para matar a sua fome; o importante é que ele não perturbe a
festa do natal do consumo e da festa. Eles precisam comemorar.
A figura que mais caracteriza este natal pagão é o Papai
Noel com seu saco enorme, sortido de ricos presentes, trazendo alegria para as
crianças e para os adultos. Jesus, quando aparece, não é o pobre que nasceu em
Belém, mas uma criança envolta em luzes, em um romantismo que nem de longe
lembra o acontecimento do nascimento entre os animais por não haver lugar na
hospedaria.
Natal
Cristão
O Natal que os cristãos comemoram é bem outra coisa. Ele
traz para a nossa realidade e nosso tempo o mistério do Deus Encarnado na
pessoa de Jesus de Nazaré. A história daquele casal que não é acolhido em Belém
e que deita o recém-nascido em uma manjedoura é celebrada na fé, na esperança
e, principalmente no amor-gratidão. Gratidão a Deus, porém traduzido no
compromisso para com todos os não-acolhidos de hoje. Natal Cristão sem
compromisso não existe. Ele até faz festa, dá presentes e enfeita a casa; mas
não fica nisso. Ele transforma interior e externamente as pessoas. Isto porque
o Natal de Jesus não fica no passado, mas é hoje. É hoje que no cristão Deus se
volta para os desvalidos da história dando-lhes vida; e, esta vida passa pelos
cristãos. Os cristãos são hoje os feitores do Natal.
Para o cristão o Natal de Jesus é muito mais do que uma
recordação do que aconteceu há dois mil anos lá em Belém. É a comemoração do
mistério da Encarnação de Deus na história e na geografia da humanidade. Isto
somente é possível para quem tem fé, pois ultrapassa longe a lógica dos sábios
e dos poderosos deste mundo. O Natal aponta para a manifestação mundial da
bondade de Deus. Quem sabe ler além das imagens do presépio pode contemplar o
rosto de um Deus que se mostra bondoso com o mundo todo. Se naquele Menino está
Deus (Ele é Deus), então o mundo é amado por Ele, pois Ele está aí, no mundo da
maneira mais humilde possível. Ninguém é afastado dele. Mas, mais ainda, este
que nasceu no Natal, aceitou ser rejeitado, condenado e crucificado! O cristão,
já no Natal, entrevê a morte por amor deste que nos foi dado. Na entrega total
de Jesus, Deus abrange tudo, e manifesta assim, a sua Verdade, a sua Beleza e a
sua Majestade. O amor de Deus é verdadeiro (o Natal não é teatro), é belo (é
coerente e sincero), e é serviço para todos.
Jesus
e os pobres
Não é possível celebrar o Natal sem levar em conta os
pobres. Alguém diz, todos somos pobres! É verdade, mas existem os que são
pobres de modo diferente, do jeito de Jesus.
Se Deus em Jesus se fez pobre e viveu entre os pobres de
todos os tipos, como podemos nós não falar dos pobres e dos excluídos ao falar
do Natal? Mas, afinal, quem são os pobres? Alguém que muito refletiu sua fé em
Jesus de Nazaré e conviveu sempre com os pobres assim explica: “Pobres são
aqueles para os quais a vida é uma carga pesada, pois não podem viver com um
mínimo de dignidade” (Pagola), justamente para os quais veio o Deus Encarnado. Resumindo,
os pobres são os que morrem antes do fim da vida! Portanto, é impossível não
levar em conta tantos irmãos que são pobres ao comemorar o Natal Cristão.
Até pode ser possível falar de Cristo, de um Cristo
desencarnado, glorioso que reina na nos altos céus, sem se referir aos pobres,
mas tratar de seu nascimento, sua vida e morte na história de um povo sem levar
em conta estes últimos, simplesmente é inaceitável. Falar de Cristo, o Senhor
lá do céu, aquele que cuida sempre de mim e resolve todos os meus problemas, é
fácil; mas falar com seriedade do Homem-Deus, Jesus de Nazaré é, no mínimo,
comprometedor. Jesus certamente resolverá minhas situações mais complicadas,
mas, à medida em que me faço seu seguidor, ele me faz sair de mim mesmo e ir ao
encontro do outro, do necessitado. Isto me liberta; isto me renova e me realiza
como ser humano. Não é a fuga do problema que resolve, mas o enfrentá-lo. É a
cruz abraçada e carregada que leva à ressurreição. Jesus de Nazaré foi
crucificado não por ter feito mal a alguém, mas pelo contrário, por ter feito o
bem àqueles que os ricos, os poderosos e os religiosos da época julgavam
culpados de sua triste sorte.
Se quisermos colaborar para que o mundo seja um pouco
mais humano deveremos forçosamente deixar que o Natal Cristão seja um encontro
com Jesus, o Deus Pobre, e, a partir dele descobrir a presença salvadora do
amor de Deus lá onde estão os últimos de todos. Sem Jesus, poderemos continuar
falando de Cristo e festejando o natal pagão, mas nunca introduziremos no mundo
o potencial humanizador de Jesus de Nazaré, que é o Deus Conosco, o Salvador do
mundo.
Sejamos cristãos de verdade: testemunhemos que o Natal é
cada dia e em cada lugar, mas especialmente lá onde as pessoas são mais
odiadas, excluídas, perseguidas e mortas. Lá está o Filho de Deus Encarnado,
Crucificado e Ressuscitado; lá deve estar também o verdadeiro cristão.
Pe. Mário Fernando Glaab.
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