PACTO
DAS CATACUMBAS (PONTO 10)
O décimo item do Pacto das Catacumbas diz: “Poremos tudo
em obra para que os responsáveis pelo nosso governo e pelos nossos serviços
públicos decidam e ponham em prática as leis, as estruturas e as instituições
sociais necessárias à justiça, à igualdade e ao desenvolvimento harmônico e
total do homem todo em todos os homens, e, por aí, ao advento de uma outra
ordem social, nova, digna dos filhos do homem e dos filhos de Deus. Cf. At
2,44s; 4,32-35; 5,4; 2Cor 8 e 9 inteiros; 1Tim 5,16”. Os textos citados: “Todos
os que abraçavam a fé viviam unidos e possuíam tudo em comum; vendiam suas
propriedades e seus bens e repartiam o dinheiro entre todos, conforme a
necessidade de cada um”; “A multidão dos fiéis era um só coração e uma só alma.
Ninguém considerava suas as coisas que possuía, mas tudo entre eles era posto
em comum. Com grande poder, os apóstolos davam testemunho da ressurreição do
Senhor Jesus, e sobre todos eles multiplicava-se a graça de Deus. Entre eles
ninguém passava necessidade, pois aqueles que possuíam terras ou casas as
vendiam, traziam o dinheiro e o depositavam aos pés dos apóstolos. Depois, era
distribuído conforme a necessidade de cada um”; “Ficando como estava, não
permaneceria tua? E vendendo-a, o dinheiro não ficaria teu? Como pôde tal coisa
passar por tua cabeça? Não é a homens que mentiste, mas a Deus”; ( 8 e 9 da 2 Cor
falam da ‘coleta para Jerusalém’ que é chamada de “ajuda aos santos”); “Se
alguma fiel tem viúvas sob seus cuidados, que lhes dê assistência, de modo que
a comunidade não fique sobrecarregada e, assim, possa assistir as verdadeiras
viúvas”.
O décimo item, acentua, sem dúvida, o compromisso que o
líder religioso tem no sentido de ser fermento na massa. Não é ele quem faz o
que precisa ser feito na sociedade, mas seu jeito de viver e de se posicionar
exige coerência de todos, especialmente dos que governam e que decidem sobre os
serviços públicos.
Poremos
tudo em obra
Os bispos estão muito bem cientes de que não são eles que
devem resolver as questões pendentes e não resolvidas pelos poderes públicos.
Esta é tarefa dos governos das nações. Mas, não querem, de forma alguma, se
acovardar. Como cidadãos, e mais ainda, como líderes cristãos, farão tudo o que
estiver ao seu alcance para que as leis sejam observadas e, consequentemente,
haja desenvolvimento harmônico para todos. É a dignidade do ser humano que está
em jogo. A nova ordem social haverá de ser digna para todos. Em outras
palavras, é a fé cristã perpassando a todas as atividades governamentais e
organizacionais.
Houve, nas décadas pós-conciliares, em nosso continente,
um verdadeiro despertar de consciências. Muitos, entre o povo simples, não se
sujeitavam mais tranquilamente às maracutaias dos poderosos. E até entre
políticos, governantes e homens que ocupavam altos cargos na sociedade civil
houve mais comprometimento. Esse novo modo de ser Igreja – evangelizando as
consciências – provocou um divisor de águas entre os conservadores e os
inovadores. O que não visava o bem de todos, e que favorecia apenas alguns, não
passava pelo crivo do povo que atendeu ao convite dos bispos do pacto.
Outra
ordem social, digna dos filhos do homem e dos filhos de Deus
Essa era a grande meta. E, não precisamos temer em
dizê-lo, sempre há de ser a meta e o horizonte da Igreja, e os bispos, dentro
dela, não podem se furtar nessa tarefa de impulsionar toda a comunidade na
direção da dignidade.
Hoje se fala da necessidade de se renovar a paróquia para
que seja “comunidade de comunidades”. Para tal se insiste na “conversão pastoral”
que deve deixar para trás estruturas obsoletas ou caducas. A paróquia, como
toda a Igreja, deve recuperar a consciência de que está no mundo, para ali ser
sinal da salvação trazida por Deus em Jesus Cristo, isto é, estar a serviço do
mundo, e não procurar ser servida pelo mundo.
O que é então possível sonhar? Os bispos, quando
assinaram o pacto, certamente sonharam com outra ordem social, mais parecida
com o ideal cristão; mas o que se pode sonhar hoje? Vito Mancuso, teólogo
italiano, em uma reflexão a partir das reações que o Papa Francisco está
provocando na Igreja, afirma que para alguns a ação do Papa suscita o sonho de
um mito antigo e sempre recorrente de um retorno à Igreja primitiva, toda
pobre, fraterna, simples, sem estruturas hierárquicas e sem leis canônicas. Mas
ele esclarece que esse é apenas um mito. A realidade é bem outra. Como sugestão
positiva, a partir da ação do Papa Francisco, Mancuso apresenta algo bem mais
humilde, mas possível: “no direito de todos os batizados de ter uma Igreja
simplesmente normal, na qual se possa confiar, uma Igreja onde os bispos não
tenham residências luxuosíssimas e caros carros azuis, onde o banco vaticano
esteja ao menos no nível ético de um banco italiano comum, onde o carreirismo e
a sujeira (termos usados pelo Papa Bento XVI) não sejam tão flagrantes a ponto
de condicionar o governo papal, onde as nomeações dos bispos ocorram por
efetivas qualidades humanas e pastorais e não por servilismo que promovem
incolores “Yes-men”, onde os
escândalos de pedofilia não sejam encobertos e os culpados protegidos, onde na
Cúria os corvos não voem até a escrivaninha papal em testemunho de venenosas
lutas internas em comparação com as quais um condomínio qualquer, com todas as
suas disputas, se torna uma imagem da concórdia paradisíaca, uma Igreja onde as
ordens religiosas não sejam guiadas por personagens culpados de pedofilia como
nos Legionários de Cristo ou de sequestro de pessoas e fraude como nos
camilianos etc., etc.” (Artigo publicado pela Ihu-Unisinos, dia 12/11/13).
Dormir é bom, mas sonhar é melhor. Sonhemos!
Pe. Mário
Fernando Glaab
WWW.marioglaab.blogspot.com.br