quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Dízimo é gratuito

DÍZIMO E GRATUIDADE DE DEUS

            Apesar de todas as explicações e reflexões que se fizeram nos últimos tempos, pode parecer que os dois conceitos – dízimo e gratuidade de Deus - não se harmonizam totalmente. Mesmo que a Pastoral do Dízimo, nas últimas décadas, tenha insistido enormemente para mostrar que o dízimo não é “pagamento”, mas oferta de amor, ainda permanece certa dúvida e até convicção, talvez escondida no profundo de nossa religiosidade, de que o dizimista fiel recebe mais bênçãos que o não-dizimista. Aliás, se Deus é justo, justiça se faz. O Deus da Gratuidade sem limites para com todos é outro assunto, que não convém abordar quando se fala de dízimo. Mas, vejamos.

Jesus e a generosidade
            Na verdade, a ideia de que Deus dá a suas bênçãos aos bons dizimistas é veterotestamentária. Jesus nunca ensinou isso. Jesus, em toda sua pregação e nos seus feitos, anunciou uma ilimitada confiança no Pai que não faz distinção entre seus filhos. Conforme Jesus, o Pai do Céu faz o sol nascer sobre os bons e os maus, chover sobre justos e injustos (cf. Mt 5,45), pois todos estão incluídos no seu amor paterno. O que Jesus anuncia e instaura é uma nova realidade, onde todos têm acesso à misericórdia de Deus. Onde a vida é valorizada naquilo que é: dom de Deus. É, em outras palavras, o Reino de Deus na terra. Neste Reino há abundância para todos, pois será vida em plenitude.
            A tarefa da Igreja, mãe generosa, é ser sinal eficaz do Reino de Deus no mundo, para que todos possam ter acesso à vida plena. Quem a experimenta, ou melhor, a vivencia a vida em plenitude, não pode mais se fechar no egoísmo que quer tudo para si. Abre-se para compartilhar com todos o que encontra no Reino. Abandona qualquer iniciativa de comércio ou barganha com relação a Deus ou ao próximo. Seu partilhar é pura generosidade. Acolhe o Reino com simplicidade; compartilha os bens na visão do Reino generosamente sem esperar nada em troca. Toda doação é fruto da pertença ao Reino, ou melhor, o Reino do Pai é a base de qualquer gesto cristão que assim se torna gratuito, como é gratuito o Reino.
            Deus não se deixa vender e nem ser comprado. Não aceita oferendas manipuladoras, mas se dá com alegria aos pequenos e aos pobres. Aliás, Jesus o louva por isso, ao exclamar: “Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequenos. Sim, Pai, assim foi do teu agrado” (Mt 11,25). O louvor de Jesus é a revelação da alegria do Pai. À medida em que o ser humano começa a entrar na ótica de Jesus, ele igualmente sente alegria ao se poder doar. Estas são coisas que o mundo não consegue entender, pois são escondidas aos sábios; não porque Deus as escondeu, mas porque ele tem outros interesses. O que procura não confere com o que os pobres e pequenos buscam. Ele corre sofregamente atrás de bens materiais, do dinheiro, do poder, da fama e do prazer. Os filhos do mundo estão anestesiados diante dos valores do Reino.

Dízimo é sinal do Reino
            Tendo como base a gratuidade com Deus nos oferece a participação em seu Reino, podemos apresentar o dízimo na visão cristã. Ele não é recomendação, ou mandamento de Jesus. É bem mais do que isso. É fruto autêntico do único mandamento de Jesus, o amor. Aquele que ama é do Reino. No Reino a vida é partilhada.
            Dar o dízimo na comunidade de fé e de vida, nada mais é que compartilhar o Reino que buscamos e que recebemos gratuitamente de Deus e dos irmãos. Dar o dízimo para que a comunidade tenha condições de existir é aprender sempre de novo a realidade nova do Reino de Deus. Não se mede a generosidade pelo valor pecuniário do dízimo, porém pela consciência da pertença do fiel ao Reino de Deus. Uma vez que no Reino de Deus há vida para todos, o dizimista colabora com sua generosidade na construção da vida do Reino em sua comunidade.
            Portanto, o dízimo cristão não é uma forma sábia que a Igreja encontrou no decorrer dos séculos para sobreviver e para adquirir as bênçãos e graças de Deus em favor dos seus fiéis, mas é partilha generosa com os irmãos da comunidade, resposta generosa de quem experimenta e vive a gratuidade de Deus na construção do Reino em meio os desafios do mundo. Mesmo que a sociedade em geral prega o egoísmo, o consumo desenfreado, a falcatrua, e tudo o mais que divide as pessoas, o dizimista continua testemunhando as coisas “escondidas aos sábios e entendidos” mas reveladas aos pequenos, os benditos do Pai, o amor generoso que sabe se doar como Deus se doou em Jesus.

Pe. Mário Fernando Glaab

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Pastoral hoje.

PASTORES CONVERTIDOS – PASTORAIS CONVERTIDAS

            Nos últimos anos, principalmente a partir da V Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe em Aparecida, falou-se muito sobre a conversão pastoral, tão necessária para a Igreja, para os pastores e para cada cristão que pretende levar a sério o Evangelho no contexto em que vive, concretamente, na comunidade onde se encontra. Comunidade esta que é sempre perpassada por sociedade extremamente plural, com situações muito diversas: gente boa, menos boa e má; gente que vive na prosperidade, gente que possui o necessário para bem viver e, muita gente que vive na carência do que é preciso para uma vida digna, que pode ser resumida nos termos técnicos: teto, trabalho e terra.

Pastor e pastoral
            Não há muito que discutir, para o cristão, ser pastor é ser parecido com Jesus de Nazaré, que desde o início da missão até o fim, sempre se apresentou e agiu como o Pastor por excelência. Ele é, e sempre haverá de ser, o modelo para quem pretende colaborar com a Igreja no pastoreio das milhares de ovelhas que andam pelos prados deste imenso continente latino-americano, tantas vezes machucadas, perdidas e famintas. O pastor, a exemplo do Mestre de Nazaré, necessita ir ao encalço das que estão extraviadas e excluídas pela sociedade que, como o lobo feroz, devora e destrói violentamente. Sem dúvida, para continuar a missão de Jesus no hoje da história e no aqui da realidade, o Evangelho necessita de atualização. Precisa ser reinterpretado a partir de onde cada pastor está – junto das ovelhas. Não dá para esquecer que o Espírito Santo que impulsionou Jesus a ir ao encontro da ovelha perdida, já vai na frente de qualquer empreendimento pastoral. Ele está lá, esperando que o pastor o descubra e o deixe agir. Ele, o Espírito, não fala; mas quer iluminar o pastor para que proclame aí a Palavra, que é o Cristo. O pastor, então, longe de se apresentar com palavras prontas, vai para junto das vítimas de todas as espécies - em uma palavra -, junto aos pobres. Lá irá reinterpretar a Boa Notícia que Jesus de Nazaré não cansa de anunciar: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pois ele me consagrou com a unção, para anunciar a Boa-Nova aos pobres” (Lc 4,18).
            A pastoral, longe de ser um “empacotado” que vem de cima, pré-concebido nas secretarias paroquiais ou diocesanas, será experiência concreta da vida querida, amada e protegida nas mais diversas situações e desafios que o nosso mundo apresenta. Planejamento não será dispensado, mas a metodologia usada em uma pastoral convertida há de ser a que o Espírito indicar em cada caso. Conforme as pessoas, sua cultura, suas tradições, seus costumes, porém especialmente, diante dos desafios mais prementes da comunidade, à luz da Palavra de Deus, da experiência do amor vivido por séculos na Igreja, escolher-se-á o melhor método de evangelizar. Esta será a pastoral convertida.

Novos conceitos e novas posturas
            O Papa Francisco nos lembra com propriedade que a Igreja deve ser “Igreja em Saída”. Mesmo que oficialmente a Igreja deixou de lado a preocupação do proselitismo, ainda existem fortes resquícios desta prática em numerosos cristãos de hoje. Isto se verifica quando nos planejamentos pastorais se olha em primeiro lugar para aqueles que normalmente participam das celebrações litúrgicas nas igrejas, contribuem com seu dizimo, têm seu filhos na catequese, fazem encontros de formação etc., e se constata, com tristeza, que são poucos. A partir desta constatação, para aumentar o número dos “arrebanhados”, procura-se encontrar o método mais conveniente para convencer o maior número possível. É o caso do pastor que diz consigo mesmo: “graças a Deus, eu tenho a igreja sempre cheia!”, e às vezes faz comparações com as paróquias dos colegas que não têm tanta sorte assim.
            Nossos tempos exigem novos conceitos e novas posturas para o trabalho evangelizador, deixando de lado a preocupação com o proselitismo, e mais ainda a competição com outras igrejas. “A Igreja não faz proselitismo. Ela cresce muito mais por ‘atração’: como Cristo ‘atrai todos a si’ com a força do seu amor, que culminou no sacrifício da cruz, assim a Igreja cumpre a sua missão na medida em que, associada a Cristo, cumpre a sua obra conformando-se em espírito e concretamente com a caridade do seu Senhor” (Bento XVI na Missa de Inauguração da Conferência de Aparecida).
            Se amor de Cristo o levou a estar junto das vítimas de todos os tempos, e assim, com eles ir à cruz, um conceito de pastoral verdadeiramente novo que gera nova postura não pode ser outro, a não ser o de estar do lado das vítimas e dos pobres em geral, mesmo que isso leve também à cruz. Esse novo conceito e essa nova postura desafiam a todos nós, mas quem não estiver disposto a tomar sobre si a sua cruz, também não é digno do verdadeiro Pastor Jesus.
            Na história do cristianismo já surgiram inúmeras preocupações para manter a Igreja bem protegida de ataques externos. No entanto, a história também ensina que muitas vezes essas preocupações, quando não bem fundadas no Bom Pastor, fizeram grande mal. Quem, no afã de ser ortodoxo, divide, separa, exclui, marginaliza ou condena, é um dos piores inimigos da Igreja e do Evangelho. Às vezes, esse inimigos são os que parecem “piedosos” e, com frequência estão entre os que têm cargos de autoridade e poder na Igreja. Cuidemos para ter ideias e conceitos claros para nãos nos tornarmos inimigos da Igreja ou sermos cúmplices dos inimigos.
            Portanto, tanto a Igreja quanto os pastores da Igreja necessitam de conversão. E sempre de novo. O Bom Pastor é o grande ideal. No entanto, as tentações de se fazer pastor e pastorear em seu próprio benefício estão sempre presentes. A conversão é um processo contínuo de purificação e de atenção, pois o Espírito clama, não por Si (não tem voz), mas o faz pela voz das vítimas de nossas sociedades injustas e excludentes. Se Jesus aceitou a função mais baixa a que uma sociedade pode submeter alguém: a de delinquente executado por blasfêmia e subversão, também os que lhe querem servir não podem temer esta mesma sociedade e o ela lhes tem a oferecer.
Pe. Mário Fernando Glaab

www.marioglaab.blogspot.com

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Misericórdia - uma maneira de "ser".

OBRAS MISERCORDIOSAS E SER MISERICORDIOSO

Durante este ano do Jubileu Extraordinário da Misericórdia que, segundo o desejo do Papa Francisco, quer levar todos à contemplação do rosto misericordioso de Deus e à prática da misericórdia em toda a nossa existência, muito se falou sobre o tema. Porém, quero aproveitar para mais algumas reflexões.

Ser misericordioso é mais que fazer obras de misericórdia
            Certa catequista, ao explicar para as crianças a necessidade de praticar as obras de misericórdia, ficou confusa diante da pergunta de uma menina. Entre as obras de misericórdia a criança se deparou com aquela que pede a visita aos presos. “Isso eu não posso fazer, pois é perigoso; e nem sei se me deixam entrar onde estão os detentos”, exclamou ela, preocupada. “Será que eu não posso fazer o que o Papa pede de nós?” A catequista não soube explicar, uma vez que estava diante de um dilema: Deus não pode querer o impossível, mas as obras de misericórdia de fato continham também esta de visitar os encarcerados.
            As obras de misericórdia são objetivas, isto é, estão aí para todos ver. Mas, nem todos podem fazer tudo. No caso da criança, é claro que não compete a ela realizar algo para o que ainda não está apta e, mais ainda, que seria perigoso e impossível. Neste caso, a virtude de prudência equilibra as coisas. Mas não é isto que quero apresentar. Pretendo refletir sobre o “ser misericordioso”.
            Interessante observar que Jesus não prega as obras de misericórdia, mas as supõe no julgamento. Pode-se entender que elas são consequências de quem é misericordioso. Ele apenas diz que é preciso ser misericordioso como o Pai é misericordioso (cf. Lc 6,36), insiste no amor ao próximo e manda seguir o exemplo do samaritano misericordioso ( cf. Lc 10,25-37).
            Levando-se em conta as palavras e as atitudes de Jesus, é possível aprofundar a questão. Jesus mostra que a verdadeira misericórdia é compartilhar a vida. Ou dito de outra maneira, é fazer-se próximo, estar junto do outro. Este outro, no entanto, não é qualquer outro, mas é o outro que está na miséria, aquele que sofre porque lhe é negado o direito de viver humanamente. O miserável é aquele que não tem acesso à vida, conforme Deus quer, isto é, não pode ser verdadeiramente humano. O que possui misericórdia faz-se próximo do miserável e lhe compartilha o coração – aproxima-se com amor. Como o samaritano, o misericordioso irá encontrar uma saída para o caído à beira do caminho da humanidade. As várias obras de misericórdia são frutos do misericordioso. Cada situação terá as “saídas” mais convenientes, conforme a prudência o exige.

Agir com misericórdia é reagir diante da dor e da injustiça
            Quem se preocupa apenas com as obras de misericórdia pode permanecer a vida toda querendo fazer o bem, mas falta-lhe uma verdadeira conversão. Não é fundamentalmente misericordioso.
            Ser misericordioso no profundo do ser significa que a misericórdia, como qualidade da pessoa lhe serve de princípio. É parte de seu fundamento. Deus é misericordioso por natureza; o ser humano, para ser verdadeiro humano, necessita se construir sobre este fundamento que lhe vem de Deus. Isso, em outras palavras, quer dizer que a misericórdia está lá onde está a pessoa. Quando a pessoa misericordiosa entra em contato com o povo sofredor, ela não fica em meros sentimentos. Ela reage. Deus escuta o clamor do povo oprimido e vem-lhe ao encontro para libertá-lo, isto encontramos no Antigo e no Novo Testamentos. O próprio Jesus veio para salvar o que estava perdido.
            O misericordioso, antes de pensar em obras de misericórdia, diante da dor do outro, reage para transformar a realidade. Eliminar o mal e implantar o bem. Procura caminhos de solução. Nesse processo não teme denunciar as causas da dor nem exigir justiça em nome e para os sofredores. A dor alheia, que o toca interiormente, desencadeia a reação misericordiosa que não se acalma enquanto não transforma a dor em bem-estar; mesmo que isso envolva denúncia, luta e que cause sofrimento. É desta reação que surgem as diversas obras, que por sua vez são tentativas para concretamente solucionar a situação na qual se encontra o sofredor. O misericordioso vai utilizando as obras conforme o momento, e, é claro, dentro dos critérios da prudência. Não comprometer um bem maior com uma solução momentânea que pode trazer mais complicações (como seria o caso da criança que fosse visitar os presos).
            Portanto, a misericórdia, como princípio do ser-cristão, define toda a sua existência. A misericórdia define o seu ser ao ponto de fazer parte integral de sua pessoa. É sempre princípio ativo de reação ante qualquer realidade negativa que faz sofrer. Assim, ser cristão é agir com misericórdia; caso contrário, todas as obras são apenas superficiais, não transformam nada.
            A esta altura dá para entender porque a sociedade tolera, e até elogia, as obras de misericórdia; mas não suporta a misericórdia. Já Dom Hélder Câmara dizia que quando dava esmola para os pobres era considerado santo, mas quando apontava os motivos da pobreza (reagia diante das causas da pobreza) era considerado comunista. Então, ser misericordioso como o Pai do Céu é uma meta que parece muito distante, mas queremos sempre de novo recomeçar o caminho. Lembremos que a distância que nos separa do irmão sofredor, que caminha ao nosso lado, pode ser grande, mas se estivermos atentos, poderemos transpô-la. Certamente nos tornaremos apáticos e até contrários aos interesses das classes dominantes, mas é por aí que vai a boa notícia do Evangelho.

Pe. Mário Fernando Glaab

Dialeto alemão do sul do Brasil - Hunsrick

DIE BLUME BRAUCHE NET SCHEN SEN WEIL SIE ES JO SCHUN SEN

Vielmols passiat bei de gute Leit in unsa Kolonie des ma enfach spiert dass was ma lebt etwas Gutes is. So oft mache die Leit Sache wo die gelehrte Mensche iwahaupt net bekeppe. So orme un net gelernte Koloniste hon doch vielmols mee gute Sache im Hetz wie die wo doch blos Wille hon awa kei Finga krum mache fa etwas Gutes tun. Wenn in unsa gute Kolonie mol ene krank is oda hot en Problem, do tun doch gleich die Nochbaschleit sich samme mache, un helfe.
Mea hatte en eltere Mann in de Gechend, dea hot so vieles Gutes getun; hot ach de Leit viel Guteswort gewe, un alles interpretiert, un en gute Sinn rausgehol. Ea is mo gefrot gep wie das wea des die enfache Leit so Gutes un Schenes mache tere, un die Grossartiche doch blos Schweinerei samme brenge tere? De gute Mann hot net lang nogedenkt, hot dan mo parlamentiert: “Das is so: die Blume brauche net schen sen, weil sie es jo schun sen”. Dan hot ea es erklert: “Die orme Leit vun unsa Kolonie, die brauche sich net gut un schen mache, weil sie es jo schun sen. Unsa Leit hon das Gutes un das Schenes insich. Die Grossartiche hon jo doch blos schlechte Gedanke im Kopp, wolle die Annere ausnutze un oanscheisse mit erre Geschefte. Ma muss sich hite von so Mensche, un muss imme zusamme halle. Dan bleibt Gott bei uns un kei Gaune kann uns klein mache.
Orich schen Baispiel. Wenn die Juchend das oach heit bekeppe tet, dan wer die Welt doch noch besse.

Glaabsmário.

sábado, 2 de julho de 2016

Deus ama gratuitamente.

Gratuidade do amor de Deus por nós

            Sentir-se abandonado por Deus é desesperador. Qualquer criatura não amada por ninguém, nem mesmo por Deus, entra em desespero. Nada mais a sustém. Ela morre, uma vez que não faz sentido viver assim.

Contradição lógica
            O Novo Testamento traz dois textos que parecem se excluir mutuamente. Um diz: “Nós que cremos, reconhecemos o amor que Deus tem para conosco” (1Jo 4,16); o outro, de Jesus moribundo, traz o grito: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Mc 15,34). Não seria este uma afirmação de falta de fé em Jesus no auge de sua entrega pela sua causa? A lógica pura não funciona. Por traz destas palavras inspiradas fala mais alto, não a lógica, mas o amor vivido e experimentado na fé.
            Ao se dizer que o amor de Deus é reconhecido pela fé, sabe-se que foi esta a experiência de Jesus e de seus discípulos em todos os tempos. Também hoje. Quem não adere, comprometendo-se com Ele, nunca vai reconhecer o mistério deste amor. Deus, em Jesus ama gratuitamente. Exclui os méritos, a observância das leis, das normas ou da religião, mas para todos tem uma mensagem de paz. À medida em que alguém se deixa tocar por Jesus é envolvido na experiência do amor de Deus, que não se explica com palavras e argumentos humanos. No grito de Jesus coloca-se o confronto com o máximo da miséria humana. O abandono de tudo e de todos. Não se justifica o grito! Contudo, no mais profundo da miséria experimentada por Jesus, naquele momento dramático da cruz, vislumbramos a mais pura fé, a mais esplêndida confiança. “Meu Deus, meu Deus, por que...?” Somente pode gritar assim, nas condição desse abandono, quem viveu, vive e viverá sempre na confiança de que Deus estava e estará presente. O abandono é ausência, mas de Alguém que, com certeza, estava aqui, e, que o estará novamente. Alguém que escuta, apesar de não se vê-lo e senti-lo. É morte física, sim; morte para Deus, não; desespero humano, sim; desconfiança no Pai, não.

Amor gratuito
            O mundo tem muita dificuldade para crer no amor de Deus. Mentalidade esta que afeta também as religiões, que ensinam, com seus preceitos, sua moral, suas leis, como se deve proceder para ter a bênção e as graças de Deus. Aquele que faz tudo conforme as regras da religião será amado por Deus. A partir dessa visão se estabelecem critérios para avaliar as religiões como mais ou menos eficientes. Provas de eficiência são bem-vindas!
            Deus, no entanto, age diferentemente. Ele não se submete aos critérios dos sábios e dos prudentes ou poderosos deste mundo. Ele se revela como o Deus que é “só-amor” nos e pelos pequenos e humildes (cf. Mt 11,25-26). Faz com que estes experimentam gratuitamente seu amor, não porque são melhores que os ricos, sábios e poderosos, mas porque lhe estão mais disponíveis. Creem mais facilmente porque não têm os muros do orgulho (bens, sabedoria humana, força e poder) trancando o espaço interior – o coração – de sua vida. Deus ama gratuitamente, oferece os segredos de seu amor. Aquele que crer, experimenta e, consequentemente participa do círculo amoroso. O amor de Deus é para que o ser humano possa amar. Deus pede o que dá e dá o que pede.
            A gratuidade do amor do Pai surpreendeu até mesmo a Jesus. Jesus bendiz ao Pai, surpreso, por fazer o contrário daquilo que todos fazem. Para Jesus a eleição dos simples e pobres para experimentar “estas coisas” já é parte dos mistérios do Reino de Deus. Quem sabe acolher o amor gratuito de Deus, como os simples e os pobres, estará colaborando na atualização do Reino definitivo de Deus; onde prosperará somente o amor.

Pe. Mário Fernando Glaab

segunda-feira, 6 de junho de 2016

Piada em dialeto alemão - Hunsrick

DE PODDA MIT SEI MESSDIENA

En Podda wo doch sei Messdiena so gut behandelt hat, hat dene mo am Endesjoha en Urlaubsrees geschenckt. Hat mo so’n Kombi vol mit Guri gemach um mo fort mit de Kelle. Sie sen uff son Platz kom wo so’n grosse Torm vun fria gestan hot. In dem Torm wo ach noch son riesig gross Glock drin. Die Buwe hon do gestan un gestauent: “Dat is doch mo was grosses un schenes” honse gemeente. Dan hot de Podda mo erkleart: “Also, die Glock – wo schun so riesig alt is -, die wet jo nore benuntz wen Hausbrand is, wen de Bischof komt oder sonscht noch en gross Unglick is im Tol ”. Di Messdiena hon gleich vestan das dem Bischof sei Besuch oach en Unglick is! Naja, es is jo ach vielmols net annesta; manchmol wer es besse wen die Bischoffe dehem bleiwe tere un die Leit gemitlich in ihre Gemeinde lewe losse. Fa mit de Leit umgehen sin jo doch die Podre do. Bis Adiee.


Glaabsmário

quarta-feira, 1 de junho de 2016

Reflexão - Silêncio

O SILÊNCIO DE DEUS E O NOSSO SILÊNCIO

            Alguém perguntou ao grande teólogo Hans Urs von Balthasar, já nos últimos anos de sua vida, depois de ter se dedicado por toda a sua longa vida na busca de dizer algo sobre Jesus Cristo, após ter escrito volumosas obras, ter proferido muitas conferências, refletido e rezado bastante, quem é Jesus Cristo para o senhor? O cristólogo teria parado, pensado por alguns instantes, e respondido assim: “Jesus Cristo é a Palavra de Deus que, por amor aos humanos, se calou.” Não nos é fácil interpretar uma definição tão curta, mas ao mesmo tempo tão rica e concentrada. Tentaremos alguns passos.

Jesus, a Palavra de Deus
            Jesus é a Palavra de Deus encarnada. Não precisamos insistir nisso, pois todos sabemos que o evangelista São João, já no início de sua obra, escreve: “E a Palavra se fez carne e veio morar entre nós” (1,14), introduzindo o seu Evangelho, apresentando Jesus Cristo. Os outros evangelistas – os sinóticos -, mesmo não afirmando como João, também falam de Jesus como aquele que revela o Pai; isto é, com suas palavras e gestos, mostra quem é Deus. Tudo o que Ele diz e faz é comunicação de Deus. Portanto, Ele é a verdadeira Palavra reveladora do Pai.
            A partir disso podemos dizer que a missão de Jesus é “falar” do Pai, sempre. O “trabalho” de Jesus é esta comunicação, e Ele não pode parar, pois estaria negando sua missão. Assim vemos que Jesus não se cansa de ensinar e de agir, realizando a obra de Deus. É o Reino presente e atuante no mundo. No entanto, a Palavra pede resposta, solicita uma outra palavra. Provoca uma palavra humana – a nossa palavra.
            Nós, os humanos, nem sempre damos a devida resposta para a Palavra de Deus; algumas vezes nos calamos. Às nossas respostas Deus continua a falar em Jesus, porém, às vezes também Eles se cala, faz silêncio. Jesus calado – morto na cruz – continua a falar, mas pelo silêncio. Provavelmente seja este o sentido que Balthasar descobriu em Jesus “calado por amor”. A Palavra que fala no silêncio e com amor para que o ser humano possa falar, e o faz com muita paciência. O ser humano, por vezes, o deixa esperar neste seu silêncio por muito tempo, outras vezes nunca responde.

Deus não respondeu
            O silêncio de Deus também é resposta, e sempre resposta amorosa. Quando Jesus estava pregado na cruz os passantes o desafiaram: “Se és o Filho de Deus, desce da cruz!” (Mt 27,40), mas ele não desceu. O Pai se calou; Jesus se calou! Por que Deus não respondeu ao seu Filho Jesus que estava sendo desafiado, e que lhe gritou “Por que me abandonaste?” (Mt 27,46)?
            Nada mais sério que o silêncio do Pai. Diante dos gritos, das blasfêmias e dos insultos do povo, somente Deus pode ficar calado. Este silêncio de Deus foi compreendido por Jesus como o sinal máximo de amor do Pai para com Ele e para com a sua obra: dar a vida pelo mundo. Deus não respondeu a Jesus, nem aos gritos da multidão, para que o ser humano pudesse se decidir e dar a sua resposta. Jesus deu sua resposta: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito” (Lc 23,46); em seu nome e em nome de seus discípulos. No silêncio Deus amou até o fim o Filho e toda a humanidade. Agora, cada um de nós pode responder ao silêncio de Deus, seguindo e exemplo do Mestre Jesus. Quando Deus se cala em Jesus Cristo, é o exato momento de nossa resposta.

Silêncio perturbador
            O silêncio, no entanto, é perturbador. O silêncio de Deus nem sempre é silêncio bem-vindo, pois nós não queremos responder ao silêncio. Pois nossa resposta nos compromete. É mais confortável que Ele fale e que nós permaneçamos calados. Preferimos um Deus falador, alguém que denuncie a injustiça, que diga o que nós queremos ouvir e legitime o que nós queremos fazer. Quando Ele faz isso, nós estamos isentos de reponsabilidade; se Ele denuncia a injustiça, nós não o precisamos fazer. Assim, Ele nos justifica diante do mundo. No entanto, é muito mais desafiador responder e nos comprometer: Ele calado e nós falando!
            O silêncio de Deus chega a ser desconcertante, perturbador e demolidor de nossos planos, esperanças e esquemas. Permanece um terrível desafio para nós. Mas não deixa de ser “palavra de amor”, uma vez que nos quer envolver – contar conosco para que assumamos com Ele a luta contra o mal, contra o ódio e contra tudo o que faz sofrer, o que elimina a vida.
            Nos momentos mais terríveis de sofrimento e de morte, quando não ouvimos a voz de Deus vindo em nosso auxílio, sem dúvida, Ele está calado em nossa dor; e mais ainda, na dor do irmão que necessita de amor maior e compreensão da humanidade.
            Não esqueçamos que o desconcertante silêncio divino, além de nos deixar falar, também nos convida a atos de silêncio, convida-nos ao silêncio humano, quando somente o amor pode ser ouvido. Participar do sagrado silêncio de Deus pode se tornar experiência de amor verdadeiro que dispensa palavras.
            Aprender a participar do silêncio de Deus seja talvez o mais árduo desafio para nós, contudo nos conduz ao amor mais humano, à prática mais verdadeira da caridade. Tenhamos coragem de nos aproximar do silêncio de Deus para, por nossa vez, aprendermos a calar, e darmos nossa pequena resposta somente com amor.

Pe. Mário Fernando Glaab