sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

A Igreja dos Pobres

A IGREJA DOS POBRES
Pe. Mário Fernando Glaab
            Muito se discutiu nas últimas décadas sobre a Igreja dita de Jesus Cristo ou dos pobres. A questão tem como base a opção preferencial pelos pobres feita e assumida pela Igreja na América latina em consequência ao movimento de libertação que aflorou nesse Continente diante da situação miserável de milhares de famintos, oprimidos e explorados pelo sistema econômico perverso que produz muitas desigualdades.
            Não queremos discutir se é mais correto afirmar que a Igreja é de Jesus Cristo ou dos pobres, pois essa questão fica para os especialistas em eclesiologia. Pretendemos partir do pressuposto de que Jesus veio para “anunciar a Boa-Nova aos pobres” (Lc 4,18) e que se “esconde” entre os pobres (cf. Mt 25,40). Jesus está com os pobres e os pobres estão co  – possuem – Jesus. A reflexão quer ficar somente diante da pergunta desafiadora sobre a Igreja como é concebida e experimentada concretamente hoje em nossas comunidades.
            Praticamente todos já devem ter ouvido que se faz cada vez mais urgente a tarefa de a Igreja ir ao encontro dos pobres – entendendo pobres em todos os sentidos. Interpelação que vem dos documentos oficiais da Igreja, dos ministros ordenados, de líderes comunitários, de agentes de pastoral, de leigos e leigas, enfim, de participantes das diversas atividades paroquiais e comunitárias. Esse apelo é visto como consequência prática do compromisso evangelizador que é de todos. Muito trabalho de ajuda é feito, isso merece reconhecimento. Pergunta-se, no entanto, se atrás dessa visão não se esconde a ideia de que a Igreja é enviada para os pobres, mas não é deles? Aqueles que querem ir ao encontro dos pobres como Igreja sentem-se igualmente pobres? Se a Igreja fosse, de fato, a Igreja dos pobres ela poderia fazer a opção preferencial pelos pobres? Não seria optar por si mesma? Vem aí a questão do onde acontece o encontro com Jesus de Nazaré. Nos últimos documentos dos bispos insiste-se, com razão, que para ser missionário é preciso ser discípulo. E, para ser discípulo não basta conhecer doutrinas sobre Jesus Cristo, mas é de extrema importância o encontro pessoal com ele. Sem dúvida, pode-se responder que o encontro com Jesus acontece na Igreja e pela Igreja, isto é, na Palavra que anuncia, nos Sacramentos e na experiência comunitária onde se vive o amor. Cai-se assim, novamente na pergunta: onde isso acontece?
            É sumamente difícil afirmar com certeza onde a Igreja acontece espiritualmente, onde e como constrói o Reino de Deus entre as pessoas. Existem muitos sinais disso, mas estão mesclados com interesses espúrios e com os pecados que negam a limpidez do Reino. Não há dúvida de que onde se vive o amor, aí o Reino acontece. Mas, para alguém dizer que isso ou aquilo é amor verdadeiro, sem mancha de egoísmo, não é tão simples assim. Há, no entanto, inúmeros sinais externos que apontam para a Igreja que quer ser comunidade de pessoas – Povo de Deus. Esses sinais externos mostram mais o que se pode pensar sobre de quem é a Igreja. Observem-se, com olhos críticos, os inúmeros templos que estão em nossas cidades, igrejas de todos os gostos, algumas são verdadeiras joias, os objetos de devoção (imagens, medalhas, terços, quadros etc.), os objetos usados nas liturgias (cálices, crucifixos, velas etc.), os paramentos usados pelos ministros (túnicas, estolas, casulas e tantos outros), as vestes das pessoas que frequentam as celebrações; nem se fala de casamentos, de primeiras comunhões, alguns batizados e formaturas! Com exceções, onde estão os pobres? Claro que há casos onde os pobres aparecem e dão testemunho de ser Igreja, mas como se disse, são exceções.
            Então, que fazer? Deixar tudo nas mãos dos pobres para ver onde a Igreja vai parar?! Alguém diz, e com certa razão, se não fossem os ricos os pobres não teriam nem igrejas para se reunir, pois são os ricos que sustentam as paróquias, constroem as catedrais, as igrejas e as capelas. São também eles que dão presentinhos para as crianças no Natal ou em outras ocasiões pontuais. Não se pode negar que pessoas mais abastadas realizam obras de caridade e colaboram com as atividades comunitárias, e que essas obras são bem-vindas pelos mais necessitados. É bom que a Igreja favoreça tais obras de intercâmbio e que dessa forma os pobres tenham, ao menos uma ou outra vez, algo para amenizar suas necessidades. Isso, todavia, não é o suficiente. A Igreja, tanto interna como externamente, precisa urgentemente recuperar a consciência de que é a Igreja dos pobres, pois se quer ser a Igreja de Jesus Cristo ela deve estar onde Jesus Cristo está. Ele está no irmão, em todo irmão, a começar pelo último, isso é, pelo pobre. E, não tem como escapar, somente uma Igreja dos pobres é capaz de assumir a missão de evangelizar. O Mestre, do qual a Igreja quer ser discípula, é o pobre por excelência.
            A Igreja, para ser verdadeiramente a Igreja de Jesus de Nazaré, precisa ser a Igreja de todas as pessoas. Dentro dela ninguém pode se sentir mais do que o outro. Muito mais que dar algo ao menor, ao pobre, é urgente que também os ricos (até onde em nossos dias alguém pode ser rico em sã consciência?!) compartilhem a vida com ele. A caridade não é dar, mas ser; pois Deus é Amor. Jesus se deu totalmente, quer dizer, é doação permanente. Quando a Igreja ensina que Jesus Cristo está realmente na Eucaristia e em todas as celebrações eucarísticas, afirma justamente a fé de que Ele é o Amor.

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